Sálvio Negreiros, o caxiense que foi um dos maiores ilustradores do Brasil

Salvio Correia Lima Negreiros nasceu em Caxias, em 31/08/1924, filho de Alice Correia Lima e Joaquim Negreiros. Tinha mais quatro irmãos: Áurea, Muriel, Júlio e Alberto. O seu pai era um conhecido comerciante de Caxias, sendo proprietário da popular “Casa J. Negreiros” , que localizava-se à Rua Aarão Reis, no centro da cidade.

Desde a infância, o desenho sempre fora a grande paixão do pequeno Sálvio. Começou rabiscando as calçadas com pedaços de carvão, com os diversos desenhos que lhe vinham à cabeça: cavalos, casas, bonecos, aviões etc. As pessoas que passavam por ele diziam: “Coitado! Esse, quando crescer não dará para nada…”. Quando as calçadas já não eram suficientes, acabou enchendo os cadernos da escola com mais e mais desenhos; firmando, pouco a pouco, o seu talento.

Em 1934, surge no Brasil, de propriedade de Adolfo Aizen, a revista Suplemento Juvenil, que foi a primeira publicação brasileira dedicada a quadrinhos de heróis e com personagens famosos das tiras de jornal norte-americanas, como Mandrake – O Mágico, Flash Gordon, Tarzan, além dos desenhos Disney, como Pato Donald e vários outros que fizeram parte da “Era de Ouro dos Quadrinhos”

Em Caxias, um exemplar da Suplemento Juvenil chega às mãos de Sálvio, e logo passa a ser o centro das atenções do jovem. Certo dia, ao folhear a revista, Sálvio deparou-se com um anúncio de um concurso de desenho. Tratava-se de fazer uma história em quadrinhos que tivesse como motivo a “Retirada da Laguna”, o feito histórico do General Camisão. O prêmio: 500.000, 00 réis. Entusiasmado, começou a esboçar o desenho, a idealizar os quadrinhos e a dar forma às figuras. Em pouco tempo estava pronto o trabalho; enviado, logo em seguida, para à redação do Suplemento Juvenil, no Rio de Janeiro.

Algum tempo depois, qual não fora a surpresa? Sálvio – então, com 16 anos de idade – ficara em primeiro lugar no concurso, entre os 25 inscritos, sendo a sua história publicada na edição do Suplemento Juvenil de 12 de junho de 1941. Em Caxias, ao receber a edição da revista, Sálvio não conseguia acreditar no que estava lendo.

Para achar mais incentivo artístico, Sálvio transferiu-se para São Luis. E lá, em 1942, tomou parte no Salão de Pintura com um quadro a óleo, tendo obtido o 2º lugar, ganhando uma medalha de prata.  A sua maior façanha, porém, teve início em 1943, quando Sálvio tinha apenas 19 anos. O episódio ocorreu quando de sua busca ao prêmio da Suplemento Juvenil no Rio de Janeiro, capital da República, à época. Acontece que, a sua viagem foi das mais acidentadas e cheia de episódios pitorescos. O itinerário foi o seguinte: saindo de São luis passou por Teresina, Fortaleza, Crato, Petrolina, Juazeiro, Pirapora, Belo Horizonte e daí para o Rio. Toda essa caminhada foi feita por trem, cavalo, jangadas, carro de boi, caminhão, “gaiola”; enfim, todos os meios de transportes possíveis. E o mais impressionante: tudo isso em 75 dias!

Mas todo esse esforço fora recompensado. Ao constatarem o talento e o esforço do jovem, os dirigentes do Suplemento Juvenil prometeram-lhe, além da premiação em dinheiro, um lugar no Departamento Artístico, tal como haviam feito com as outras pratas da casa, como Fernando Dias da Silva, Celso Barroso e Antônio Eusébio; todos, como Sálvio, vencedores de concursos idênticos.

E assim fora feito. Sálvio, após mudar-se para São Paulo (onde a editora tinha o seu estúdio), desenhou histórias de aventuras para a revista, durante vários anos. Além do trabalho com quadrinhos, Sálvio, através do “Studio Artenova” – da editora carioca de mesmo nome fundada em 1962 -, ficou muito conhecido por suas ilustrações para capas de obras literárias, bem como para o mercado publicitário (Nesse estúdio, Sálvio também era responsável pela direção de arte).

Amigo de Ziraldo, fez parte da primeira geração de quadrinistas brasileiros. “Convém informar aos leitores que eu conheci Fernando, Sálvio e Celso, junto com Monteiro Filho – que são os quatro maiores ilustradores que já apareceram depois na publicidade brasileira”, disse, em 1972, o criador do Menino Maluquinho.

Em 1971, Sálvio volta a residir, junto à sua família, no Rio de Janeiro. Cidade na qual veio a falecer, em 1991, vitimado por um câncer de próstata. O caxiense deixou esposa, filhos e três netos. Um de seus filhos, Carlos Negreiros – que, gentilmente, contribuiu para esta postagem -, seguiu passos semelhantes aos do pai, atuando profissionalmente com Diretor de Arte.


Fontes: Genealogia da Família Correia Lima; Suplemento Juvenil (Diversos Números); Blog Tiras Memory; Wikipédia; Informações cedidas por Carlos Negreiros

Paulino Almeida, um músico caxiense de sucesso

Em uma quinta-feira do mês de julho de 1952, jazia no chão da Praça Tiradentes, berço da vida noturna carioca, o corpo de um homem. Ladeando-o, agarrado à sua mão, um saxofone. Naquele local, em frente ao Teatro Carlos Gomes, pouco tempo antes, o falecido havia executado aquela que seria a sua última apresentação. Nem todos sabiam, mas aquele músico não era filho do Rio de Janeiro, e sim da distante Caxias, no Maranhão. Seu nome: Paulino Almeida.

Filho de Augusto Paulo de Almeida e Maria José (Zezé) Teixeira Santos, Paulino nasceu em Caxias, no dia 10/04/1909 (existem relatos de que a data seria 03/04/1904). “Paulino” era apelido; na verdade, o seu nome completo era: Paulo Augusto de Almeida Santos. Tinha mais três irmãos (Djalma, Docila e Raimundo), sendo, o mais novo, de nome Raimundo (nascido em 1917) – que, anos mais tarde, seria conhecido apenas por Mundico Santos.

Desde pequeno, Paulino já demonstrava um grande interesse por música. Ainda criança, dedilhava, com habilidade, numa flauta de bambu, os sambas e tangos que a banda Carimã do maestro Alfredo Beleza executava nas festas da cidades e salões dos clubes. Vendo – e ouvindo – as habilidades do jovem, o velho Beleza convidou-o a estudar as primeiras noções de melodia com ele.

Logo, Paulino passou a integrar a orquestra Carimã e especializou-se no saxofone. Quase como uma extensão de seu corpo, o músico passou a dominar, com extrema habilidade, aquele instrumento. Como maestro, também chegou a fundar a sua própria orquestra. Executando composições suas ou de outros músicos, Paulino tocava belos solos pelas ruas de Caxias. À luz do luar, notívagos e boêmios paravam para ouvi-lo. Em serenata para damas, o nome de Paulino era bastante procurado.

Talvez por seu estilo mais popular ou por uma questão de preferência, Paulino não podia apresentar-se no salões da cidade, sobretudo do Cassino Caxiense (que, nessa época, funcionava no Edifício Duque de Caxias), União Operária e Centro Artístico. Contudo, nem por isso deixava de exibir sua arte. Logo, encontrou uma solução. Nas décadas de 20 e 30, quando chegava o Sábado de Aleluia, o músico providenciava um palanque no Largo do Rosário e convidava a população para o espetáculo. Como naquele dia acontecia a tradicional “Malhação do Judas”, Paulino também elaborava o testamento do boneco, em um texto cheio de humor.

Dando início ao evento, Paulino, de terno branco e colete, começa a tocar os seus solos de sax, tendo como interlúdio algumas piadas que contava para tirar risos dos presentes. “Os solos, num crescendo, aumentavam a vibração. Chega-se ao ápice. A leitura do testamento do Judas. […] Criança! – e carregado pelas mãos do meu genitor Cocó – eu assistia àqueles espetáculos. Com vibrantes solos de sax e testamentos de Judas, sob medida. Os mais lindo que, ao fio dos anos, a mim me foram dado ouvir. Nem além nem aquém – sendo a crítica na medida certa”. (Libânio da Costa Lobo; Livro Vulto Singular).

O jovem Marcello Thadeu Assumpção (que, anos mais tarde, tornou-se aclamado médico e político) também testemunhou os talentos do músico: “Década de 30. Quando me tocava de sorte passar pela Rua São Benedito, precisamente pela porta da casa de dona Zezé Teixeira Santos, eu era levado a diminuir a marcha das minhas passadas para, numa curiosidade natural e justificável, ficar ouvindo o maravilhoso saxofone do maestro – Paulo Almeida, filho de dona Zezé. Não me contendo, batia palmas e pedia para entrar e ver de perto o maestro executar o seu instrumento”.

Desejando voar mais alto em sua carreira, na década de 30, Paulino mudou-se para a capital do Estado. Em São Luis, foi conquistando as graças do público, passando a ser conhecido como “príncipe dos saxofonistas do Norte”. A alcunha veio após integrar o conjunto “Jazz Alcino Bílio”, que excursionava em todo Norte e Nordeste do Brasil. Além de Paulino, a banda era composta por: José de Ribamar Passos, o “Chaminé”, pianista e acordeonista; João Pereira Balby, saxofonista vienense; e o saxofonista Hélcio Jardim Brenha. José e Paulino alternavam-se na regência do grupo. Tamanho foi o sucesso que, em agosto de 1937, a banda chegou a se apresentar nos jardins do Palácio do Governo do MA.


À parte a atuação no conjunto (Paulino deixou a jazz band por volta de 1938) e da profissão como professor de música, Paulino também tinha uma vitoriosa carreira solo, tendo realizado inúmeras composições. Em 1935, por exemplo, compôs “uma sublime rapsódia”, que denominou “João Pedro da Cruz Ribeiro”. O homenageado que dava nome à composição, era genitor do dr. Fernando Ribeiro, respeitado Chefe de Polícia do Maranhão. Sob a batuta de Paulino, a música foi executada pela banda do 24 BC, na praça Benedito Leite, em São Luis.

Apesar da carreira exitosa em seu Estado Natal, Paulino queria mais. Já como um músico experiente e de fama, decidiu rumar para a então capital da República, o Rio de Janeiro. E assim, em julho de 1941, pelo “Itapé”, Paulino Almeida despediu-se dos maranhenses. O artista não sabia, mas nunca mais voltaria à sua terra.

A nova cidade não era de todo estranha. Afinal, no Rio, levou a sua música para a Associação dos Maranhenses, que estava sob a presidência do Dr. Antônio Dino, e vice-presidência do caxiense General José de Jesus Lopes. Todo e qualquer evento realizado pela Associação, chamava-se o músico para apresentar-se. Orgulhoso de suas conquistas, em terras cariocas, Paulino posou para uma fotografia segurando o inseparável saxofone. O registro tinha destino certo: d. Zezé. De terno alinhado e sorriso no rosto, o filho dedicava à mãe aquela singela lembrança, que se tornaria o seu único registro fotográfico conhecido. Ao fim, colocou a data: 08 de julho de 1948.


“[No Rio de Janeiro] Floresceu o seu talento musical. Na mesma medida, expandiu-se sua boemia. Com epicentro na Praça Tiradentes, tocava nos dancings e boates” relembrou Libânio. Apesar das apresentações entre seus patrícios, as coisas não iam como Paulino ambicionava, haja vista o seu modesto sucesso na capital federal. Possuidor de uma vida boêmia bastante ativa, com as dificuldades financeiras, Paulino intensificou ainda mais o vício no bebida. Daí para o alcoolismo, não precisou de muito.

Além do narrado acima, quase mais nada se sabe sobre a vida profissional e pessoal do músico durante a sua fase no Rio de Janeiro. O seu nome só volta ser citado nos jornais no dia de seu falecimento, em 10 de julho de 1952, após um ataque cardíaco em plena Praça Tiradentes, aos 43 anos de idade. Tendo sido sepultado em um cemitério do subúrbio carioca. “A notícia, espalhando-se, rápida que nem rastilho de pólvora em canavial, chegou à Associação Maranhense. A todos compungindo. De imediato, localizou-se o cadáver e, sob a supervisão solícita do vice-presidente General José Lopes, ocorreu o enterro. Tudo às expensas, escusado dizer, dos seus conterrâneos.” (Libânio Lobo; Livro Vulto Singular).

Calou-se Paulino, calou-se o seu sax.

Em Caxias, corria-se no imaginário popular, com testemunho de muitos caxienses, que, na hora em que Paulino faleceu no Rio de Janeiro, no Largo do Rosário, um saxofone, envolvido por luminosa auréola, envolou nos ares, espargindo belos solos musicais, como aqueles do Sábado de Aleluia.

Em sua homenagem, a Câmara Municipal de Caxias, através da Lei n°200 de 01/10/1952, renomeou a via (que liga a Rua Afonso Pena à Rua São Benedito) que ladeava a residência de sua família, no centro da cidade, para “Travessa Paulino Almeida”, nome que permanece até os dias de hoje. Em memória do irmão, Mundico Santos pintou, baseado na fotografia enviado por Paulino à mãe, um retrato seu, que atualmente integra o acervo da Academia Caxiense de Letras.

Paulino Almeida deixou várias peças populares para piano solo, disponíveis hoje no Arquivo Público do Estado do Maranhão (APEM).


Fontes de pesquisa: Áudio Arte – Memórias de um Blog Musical/Autor: Daniel L. Cerqueira; Música – O Piano no Maranhão: Uma pesquisa artística/Autor: Daniel L. Cerqueira; Jornais “Folha de Caxias” “O Cruzeiro” “O Imparcial” “Pacotilha” “O Combate”; Livro Memórias/Autor: Marcello Thadeu de Assumpção; Livro Vulto Singular/Autor: Libânio da Costa Lobo; Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto; APEM- Arquivo Público do Estado do Maranhão

“Dona Sinhá” e “Seu Dá”, as homenagens de João do Vale e Luiz Gonzaga à Caxias

Quando Luiz Gonzaga pegou “um trem em Teresina pra São Luis do Maranhão”, as coisas não iam muito bem em sua carreira. Considerado algo démodé, nas décadas de 50 e 60, com a chegada da bossa-nova e, posteriormente, da Jovem Guarda, o baião do velho Gonzagão saíra dos holofotes. Foi um duro golpe ao experiente músico.

Contudo, diferentemente das demais regiões do Brasil, o Nordeste nunca abandonara o seu ilustre filho. Sabedor desse prestígio, Gonzaga, nesse período, excursionou, quase que exclusivamente, por cidades nordestinas. Fazendo parte desse itinerário, Caxias fora uma delas. Por contratação realizada pelo próspero empresário Alderico Jefferson da Silva, o músico veio à cidade, na década de 1950, em ocasião do aniversário de um dos negócios do contratante, o “Armazéns Caxias”. O show teve lugar em frente ao estabelecimento, nos arredores da praça Gonçalves Dias. Para hospedar Gonzaga, fora providenciado um quarto nas dependências do “Palace Hotel”, à Rua Afonso Pena.

A proprietária e administradora do hotel era a popular “dona Sinhá Serrath”, apelido de Rosa Amélia de Jesus Serrath. Nascida a 06 de setembro de 1889, poucas informações sobre a sua biografia chegaram aos nossos tempos. Mãe da célebre professora Dacy, d. Sinhá, sempre pitando cachimbo e adornada de joias, comandava aquele hotel desde a primeira metade do século XX. E fora ali, nos cômodos do Palace (amplo casarão colonial de numerosas janelas), que Luiz Gonzaga acomodou sua sanfona e “se arranchou” antes de sua apresentação em Caxias. No local, o músico ainda encontrou tempo para prosear e desfrutar de algumas doses de conhaque. Tudo por conta de Alderico.

Outro amigo e, neste caso, conterrâneo – ambos nascidos em Pedreiras (MA) – de Alderico era o também músico João do Vale. O artista, que já tinha algumas composições suas tocando pelo Brasil (nesse período, João ainda não havia assumido os vocais), fazia visitas recorrentes ao amigo comendador, em Caxias, que o ajudava financeiramente. Assim como Gonzaga, João, quando de suas vindas a Caxias, também passava pelo Palace. E assim, em 1962, narrando um percurso que fazia frequentemente, João do Vale escreveu a canção “De Teresina a São Luis”, onde, além de homenagear o amigo e “mecenas” Alderico, citava d. Sinhá Serrath, conhecida sua de longa data. Para entoar a canção, o escolhido não poderia ser outro: Luiz Gonzaga. Lançada pela RCA, a música é a quinta faixa do LP “Ô véio macho”.

Oficialmente, a canção é composição de João do Vale e Helena Gonzaga, então esposa de Luiz, que também assinou outras oito músicas. Contudo, segundo os entendedores "gonzaguianos", Helena não era compositora. "Era o próprio Luiz Gonzaga o autor das músicas, pois naquela época um artista não podia fazer parceria com outro sendo de gravadoras diferentes por questões de direitos autorais. Daí Helena entrou na jogada e foi nomeada pelo marido como 'Madame Baião'" (Fonte: Blog "Viva o Reio do Baião").Além disso, é muito provável que Luiz Gonzaga não tenha tido envolvimento direto na letra de "De Teresina a São Luis", tendo ficado com a parte de musicar e, posteriormente, gravar o xote. Contudo, esse ponto ainda é muito discutido. 

O xote que narra, como o próprio nome sugere, uma viagem de trem entre as duas capitais, faz menção a cinco cidades maranhenses: Caxias, Codó, Coroatá, Pedreiras e São Luis. A estrofe caxiense é a seguinte:

“Bom dia Caxias
Terra morena de Gonçalves Dias
Dona Sinhá avisa pra seu Dá
Que eu tô muito avexado
Dessa vez não vou ficar”

“Seu Dá” era Alderico. Como uma forma de autopromoção, reza a lenda de que a alcunha teria sido disseminada pelo próprio empresário que, ao comercializar os seus produtos, nada vendia, mas dava, de tão baratos que eram. À boca pequena, os seus desafetos chamavam-no de “Seu Toma”.

Ao contrário de “Seu Dá”, que todos sabiam se tratar de Alderico Silva, a outra personagem citada já fora motivo de confusões. Ocorre que, por muito tempo, acreditou-se que a “Dona Sinhá” mencionada na música seria a esposa de Alderico, Dinir Costa e Silva. Um erro até compreensível. Contudo, como vimos, a “Sinhá”, aqui, era outra.

Quando Luiz Gonzaga esteve novamente em Caxias, em 29 de maio de 1966, trazido pelo então prefeito Aluízio Lobo, o músico fez questão de deixar uma dedicatória ao amigo em um livro, de autoria de Sinval Sá, que narra sua história de vida. Na obra intitulada “O Sanfoneiro no Riacho da Brigida”, o músico escreveu: “Ao amigo Alderico Silva, com os cumprimentos de seu cantor, Luiz Gonzaga.” Nesse mesmo show, realizado na praça Vespasiano Ramos, os caxienses puderam presenciar um “Velho Lua” em plena forma, terminando o espetáculo com um recado aos que pensavam que o seu tempo já tinha passado. Fazendo menção à bossa-nova, a plenos pulmões o músico bradou: “A minha bossa eu também já fiz!”.


João do Vale, por sua vez, não parou com as homenagens ao conterrâneo. Até pela proximidade entre as cidades, suas visitas à Caxias eram bastante recorrentes, como destaca esta nota, abaixo:

Ainda na década de 1960, João compôs a música “Vou pra Caxias”. Desta vez, a letra era toda voltada à cidade. Citando as maravilhas naturais e os santos padroeiros, João intercalou o famoso refrão: “Não adianta/Aqui não fico/Vou pra Caxias, onde está seu Alderico. Além disso, a canção citava os dois filhos varões do empresário: Getúlio e Aldenir. Como intérprete, fora escolhido o paraense Ary Lobo.

Por nunca ter sido um bom administrador de suas finanças, João sempre viveu de forma bastante humilde, o que nunca lhe fora um problema. Certa vez, já com a saúde bastante debilitada por um AVC, o compositor foi questionado se havia sofrido muito em sua vida, o que, de pronto, respondeu: “se eu sofri eu não sei, porque eu gostava”.

Na década de 90, pouco antes de seu falecimento, João ainda vinha à Caxias visitar o velho amigo, Alderico, em seu palacete e, de quebra, receber aquele agrado monetário sempre muito bem-vindo.

E como tudo nessa vida passa, os protagonistas dessa história também já se foram. Contudo, como toda obra artística de qualidade, que desconhece a efemeridade, as músicas de João e Gonzaga eternizaram-se no cancioneiro popular. Provando mais uma vez que tudo que é bom sobrevive aos testes do tempo.


Fontes de pesquisa: Jornal do Maranhão; jornal “Folha de Caxias”; Blog “Viva o Rei do Baião”; Wikipédia; Texto “Momento Poética: Luiz Gonzaga, o Rei do Baião/Autor: Edmílson Sanches; Depoimento de Mário Gomes

A. Oliveira, o artista que pintou Caxias

“A pintura é poesia sem palavras.” – Voltaire

Quem quer que tenha visitado o Memorial da Balaiada, Instituto Histórico e Geográfico de Caxias (IHGC), Câmara Municipal ou o prédio da Prefeitura, com certeza já se deparou com as obras deste artista. De cores vibrantes, as pinturas captam imediatamente a atenção de quem as observa. Além das belas representações, no canto inferior das telas os visitantes mais atentos podem notar a assinatura de seu autor: “A. Oliveira”. A rubrica nada mais é que o nome abreviado de: Antônio Francisco de Oliveira.

Caxiense nato, “seu Oliveira” – como era mais conhecido – nasceu em 24/08/1929, filho de d. Perine e José Domingos Oliveira. Seguindo o ofício do pai, o pequeno Antônio começou a trabalhar como marceneiro. Através desta profissão, já ajudava desde cedo no sustento de casa. Tinha mais seis irmãos, quatro homens e duas mulheres.

Ambicionando ares mais artísticos, ainda na juventude, após se deparar com um anúncio de um curso de pintura, por correspondência, do Instituto Universal Brasileiro, resolve embarcar na empreitada. Pela modalidade de ensino empregada, o curso não se mostrava muito eficaz, tendo o caxiense que contar com uma grande dose de auto-didatismo. Muito humilde, no início Oliveira fazia a matéria prima de seu trabalho utilizando os recursos naturais que tinha à disposição: da casca do pequi em decomposição, fazia a tinta preta; do urucum, fazia a tinta vermelha; do calcário, tinta branca. Adepto a um estilo de pintura mais impressionista, suas obras, em óleo sobre tela, imprimiam as marcas de suas rápidas pinceladas.

Aos poucos, Oliveira foi ganhando confiança, desenvolvendo seu estilo, e seu trabalho conquistando a admiração dos apreciadores de arte. Já reconhecido pela beleza de suas pinturas, na década de 1970, em homenagem póstuma ao padre Aderson Guimarães, o pintor resolveu eternizar o clérigo em sua tela. Tendo como referência uma fotografia, em preto e branco, do padre, o artista pintou um quadro, em tamanho natural, o qual fora destinado à Diocese de Caxias.

Mesmo tendo sempre variado nos objetos que retratava em suas pinturas, o artista tinha uma predileção pelos cenários caxienses. Pintando desde praças, natureza morta, objetos, pessoas, igrejas, riachos, casarões à reconstituições de episódios históricos. Quando da fundação do Memorial da Balaiada, em 2004, fora encomendado a Oliveira uma tela que retratasse a respectiva guerra. Nascia, assim, aquela que talvez seja a sua obra mais conhecida. Em sua interpretação visual dos fatos, o artista buscou retratar a violência e barbárie que marcaram esse episódio.

Além do trabalho pictórico, Oliveira produziu algumas esculturas. Na administração da prefeita Márcia Marinho, esculpiu para a Avenida Santos Dumont, em Caxias, um busto do famoso aviador, posto sobre um pilar modernista em forma de avião. Pilar, esse, que, em 2019, acabou sendo destruído, após um acidente de carro partir a estrutura ao meio, danificando também a escultura, que foi reformada e reposta no ano seguinte. Também chegou a produzir um busto de Vespasiano Ramos, que guardava em sua casa.

Trabalhando na Secretaria de Cultura de Caxias, Antônio ministrou aulas de pintura nas dependências do Centro de Cultura José Sarney. Casado com Maria Antônia da Luz de Oliveira, o artista teve três filhos; tendo residido em um imóvel localizado próximo à antiga estação férrea (atual CEFOL). Em 2001, recebeu o título de comendador da Ordem do Mérito Poeta Gonçalves Dias, de acordo com a lei municipal nº 1469/2001. Em 2018, a Exposição “Balaiada, A luta sem fim – 180 anos da revolta” trouxe suas obras ampliadas e colocadas no corredor de acesso ao Plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília/DF.


Em 2020, através de uma iniciativa da Feira de Artes de Caxias intitulada “Invisíveis Presentes”, Antônio Oliveira, já em idade avançada, foi fotografado pelas lentes de David Sousa. A exposição virtual teve o intuito de homenagear alguns caxienses ilustres. Esse talvez tenha sido o último registro de Antônio, em vida; já que no dia 12/03/21, aos 91 anos de idade, o artista faleceu; tendo produzido mais de 800 telas, espalhadas pelo Brasil e exterior.


Fontes de pesquisa: Livro “Cartografias Invisíveis”/Vários Autores; Perfil do Instagram “Feira de Artes de Caxias; Livro “Por Ruas e Becos de Caxias”/Autor: Eziquio Barros Neto

O “Bar Operário” de Herval Lobo

Toda cidade que se preze, especialmente as interioranas, tem um bar de estimação. Popularmente conhecidos como botecos ou bodegas, estes estabelecimentos são o ponto de encontro dos apreciadores do popular líquido estritamente vedado aos passarinhos. Verdadeiras “confrarias da boemia local”, ali, entre um golada e outra, muitas amizades são formadas, brigas são apartadas, as pazes são seladas, apostas são firmadas e – mais frequentemente – mentiras são contadas. Não necessariamente nessa ordem.

Fazendo parte desse rol, em Caxias, o “Bar do Herval” é, sem dúvidas, um dos mais lembrados pelos saudosistas. Mas, antes de falar sobre o bar, em si, discorramos um pouco sobre o seu proprietário.

Vindo de uma tradicional família caxiense, Herval Lobo e Silva (muitas vezes o seu nome é grafado sem o “H”) nasceu em Caxias, no dia 08/07/1911. Fruto da união de Libânio Filho com d. Bezina, Herval era neto do conhecido coronel Libânio Lobo. Tinha mais três irmãos, Joacir, Waldemar e João Lobo. De sua juventude, quase nenhuma informação chegou aos nossos dias. Sabe-se que, seguindo o tino comercial do irmão, João (proprietário da “Casa Matoense”), Herval decidiu abrir um negócio, mais modesto e menos ambicioso. E assim, sob o nome de “Bar e Mercearia São José Operário”, Herval inaugurou o seu estabelecimento.

A data de sua fundação é incerta. O seu primeiro anúncio publicitário, que se tem notícia, data da segunda metade da década de 1940, levando à conclusão de que seja essa a data aproximada de sua inauguração. Funcionando em amplo casarão de estilo colonial, na esquina do antigo Beco da Estrela com a Rua Afonso Pena, o estabelecimento tinha sua fachada virada para a praça Vespasiano Ramos. O nome do bar ficava posicionado em uma placa de vidro, iluminada de dentro para fora, com luz de lâmpadas fluorescentes. No meio da placa, em tintas coloridas, o busto pintado de São José, segurando, com uma das mãos, o menino Jesus, e vários lírios brancos, na outra mão. Logo abaixo da imagem, o nome de Herval.

Herval, ou “Seu Herval” para os menos íntimos, era um comerciante agoniado. Andava, no bar, de um lado ao outro, quase sem parar. Por uma deficiência em uma das pernas, arrastava um dos pés. Dias, estava falador, comunicativo; dias, estava mais calado, pensativo. Quando estava nervoso, apresentava gagueira. Não muito vaidoso, quase sempre as suas camisas estavam abertas na altura da barriga, e os cabelos (as vezes, curto;, as vezes, mais longos) desalinhados – na década de 1980, chegou a cultivar uma longa barba. Quando não estava com um toco de charuto no canto da boca, ficava mascando fumo bruto e, minuto a minuto, cuspindo o sumo do tabaco em uma caixinha cheia de terra, que ficava na parte interna do extenso balcão de madeira.

Além do bar, no local também funcionava uma mercearia e um restaurante improvisado. A freguesia, além da vizinhança, era composta por pessoas que vinham de longe para comprar mantimentos de primeira necessidade, tendo em vista a diferença de preços. “Herval visava o menor lucro e mais fregueses. Foi o pioneiro na venda de conservas. Começou, vendendo massa de tomate, sardinha, leite condensado e goiabada, os primeiros enlatados fabricados no Brasil e conhecidos em Caxias”, relembrou o saudoso escritor Firmino Freitas, em seu livro de memórias.

Firmino também relembra como era o bar em dias festivos: “O bar, além das novidades trazidas, em primeira mão, para Caxias, tinha utilidade de agenda, isto é, funcionava como calendário. Todas as datas eram lembradas de uma maneira ou de outra. O Carnaval era lembrado com máscaras, feitas de pedaços de jornal colados com grude de tapioca sobre fôrma de barro, por uma senhora da Rua da Estrela, e vendidas a preços módicos; a Semana Santa, pelo bacalhau norueguês importado em barricas ou caixas de madeira, (…) que era pendurado em uma das portas, qual bandeira; o Natal, pela venda de bolas de borracha e pequenas bonecas de baquelita, de celuloide ou de pano com cabeça, pés e mãos de porcelana. No período das festas juninas, eram lembrados com venda de traques, bombas de várias potências de explosão, trepa-moleques, espanta-moscas (…)”.

No Sábado de Aleluia, era Herval o responsável pela fabricação do boneco do Judas que viria a ser malhado na praça em frente. Quando dos festejos de São Benedito, Herval tirava mais mesas do depósito, e as colocava na parte de fora do bar, na calçada e no calçamento de pedra bruta, no lado que dava para o largo da festa.

O fregueses do Bar Operário pertenciam as mais diversas classes sociais e profissionais. Como bem definiu um de seus habitués, Enoch Torres da Rocha: “Era o ponto de encontro dos P.P.S. (Pinguços, Poetas e Simpatizantes). Em suas democráticas mesas sentaram diversos empresários, comerciantes, poetas, políticos, intelectuais ou simples pinguços contumazes. Mesas, essas, de um pé só, um pé central em cruz para manter o equilíbrio, feitas de cedro com polimento escuro e ornadas com tampo de vidro pintado com o nome do bar ou com propagandas das outras casas comerciais existentes. Dentre os caxienses que passaram por aquele balcão, destacam-se: Nachor Carvalho (industrial), Acrísico Cruz (jornalista e poeta), Leôncio Magno (professor e jornalista), Nanito Souza (comerciante) etc… Homens que, após mais uma jornada de trabalho, passavam no bar para bater papo e tomar um “digestivo”, abrindo, asism, o apetite para mais um tira-gosto.

“Para o tira-gosto, não faltava no balcão-vitrina, uma leitoa assada inteirinha, com maçã na boca e azeitonas nos lugares dos olhos. A leitoa, tipo pururuca, era colocada em uma grande bandeja, ornada com rodelas de cebola, tomate e limão, e a indispensável farofa, gorda, corada com corante de urucum ou açafrão. Não se sabe se a cerveja gelada, “véu-de-noiva”, era o chamariz, ou as leitoas e os capões assados é que atraiam os fregueses para o bar, diariamente, depois do expediente dos escritórios e de parte do comércio do centro da cidade” (Memórias de Firmino Freitas).

Além dos adultos, a criançada também era presença constante no Bar Operário (com o tempo, o estabelecimento teve o seu nome encurtado), quer fosse para comprar os mantimentos para casa, quer fosse para comprar guloseimas e picolés. Os picolés de Herval eram uma atração à parte. Além dos picolés de juçara, coalhada, cajá e imbu; eram vendidos os de sabor morango, que, segundo relatos, eram pura anilina azeda, com o cheiro enjoativo. O mais vendido era o de coco, feito com bagaço e tudo – não se sabia se estava comendo ou chupando o picolé. Apesar dessas ressalvas, os picolés de Herval – talvez pela falta de opções – faziam sucesso entre a garotada.

Já na década de 1990, com mais de quarenta anos em funcionamento, Herval ainda era o responsável pelo Bar Operário. Muito trabalhador, levantava, diariamente, às 5h da manhã. Ritmo de trabalho que foi ficando cada vez mais difícil de manter, afinal, já contava com mais de oitenta anos de idade. “[Herval] Reclamava, sempre e sempre, de dores no corpo e de um incômodo que lhe causava uma hérnia no abdômen, além de frequente dor de cabeça; As dores eram denunciadas pelo mau humor; a hérnia, pela protuberância que dias estava menor, dias de visível aumento” recordou Firmino, cliente e amigo de Herval.

Ainda assim, Herval manteve o seu estabelecimento em funcionamento até próximo ao seu falecimento, ocorrido em 23/04/1995, aos 83 anos de idade. Não deixou descendência. Após a sua partida, o Bar Operário também encerrou suas atividades e o casarão passou a abrigar diversos estabelecimentos, em sua maioria bares e restaurantes. Atualmente, o imóvel, que ainda conserva parte de suas feições originais, abriga uma farmácia.


Fontes de pesquisa: Livro “Festejos de São Benedito”/Autor: Firmino Antônio Freitas Soares; Depoimento e arquivos cedidos, gentilmente, por Wilton Lobo; Livro “Por Ruas e Becos de Caxias”/Autor: Eziquio Barros Neto

Imagens da publicação: Ac. do IHGC; Jornal “O Cruzeiro”; Ac. de Wilton Lobo; Internet

Restauração, Colorização e Design das imagens: Brunno G. Couto

Cristino Gonçalves

Filho de Pedro Nunes Gonçalves, Cristino Nunes Gonçalves nasceu em Caxias no ano de 1904. Na juventude, junto ao irmão Moisés, ganhou o apelido de Cristino “Papagaio”, em virtude deste ser o nome popular do lugar onde morava. Já na faixa dos trinta anos de idade, Cristino casa-se com a jovem Mariana Costa Gonçalves.

Profissionalmente, Cristino atuou por muitos anos como Delegado de Polícia em Caxias. Sempre com o inseparável terno de linho branco, o seu traje era característico, com relembra Libânio Lobo: “Com traje característico, em que sobressaía indefectível chapéu de abas largas, vigiava a urbe, sempre presente nos logradouros públicos”. Além da autoridade intrínseca ao cargo que ocupava, o delegado, que era bastante alto, também impunha respeito em virtude de seu porte físico.

“Personagem folclórico o Cristino Papagaio! Era maniqueísta, na política. Com efeito. Para ele, trairia os interesses da comunidade quem não militasse ao lado do governo. Era o mal. Por isso mesmo, fosse quem fosse o governo, ele apoiava o oficialismo. E, para ele, o governo não errava. Acertava sempre, De feito, qualquer providência, desde que oficial, que tinha o seu endosso e aplauso. Não havia por que inquiná-la”, relembrou o escritor Libânio da Costa Lôbo em suas memórias.

Além de delegado, Cristino também era proprietário de uma vacaria (funcionava no quintal de sua residência), onde oferecia a venda de leite por toda Caxias. Na década de 1950, candidatou-se a vaga de vereador; sendo eleito nas legislaturas de 1951/1954; 1955/1958 e 1963/1966. Contudo, faleceu antes de terminar este último mandato. Ocorre que, no dia 16/02/1964, Cristino faleceu após passar por uma operação – em virtude de uma queda de rede – no Hospital Getúlio Vargas, em Teresina. Tinha 60 anos.

Quando do loteamento da área que originou o bairro Volta Redonda, fora aberta uma rua nas proximidades do local onde Cristino Gonçalves residiu por quase toda a vida. Destarte, fora dado o seu nome àquela via.


Fontes de pesquisa: Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto; Livro Vulto Singular, em Meio a Rico Mosaico/Libânio da Costa Lôbo; Livro O Fim e o Nada/Autor: João Machado; Depoimento de Saraiva Porto

Imagens da postagem: Ac. IHGC; Ac. Lucinha Maria Chaves Marques

Restauração e Colorização: Brunno G. Couto

Paulo Souza e os sambas-enredo da Turma da Mangueira

Nos carnavais caxienses de outrora, os blocos carnavalescos e escolas de samba eram tradição. Grupos como “Malucos por Samba”, “Os Caveiras”, “Os Caveiras do Samba”, “Turma da Mangueira”, “Unidos do Olho D’água”, “Unidos da Baixinha” eram figurinhas carimbadas nas festividades. Compostos por instrumentos de percussão, porta-bandeiras e passistas, esses blocos, que recebiam o apoio da prefeitura, desfilavam pelas ruas de Caxias no período de carnaval.

Pesquisando sobre o tema, deparei-me com dois sambas-enredo da “Turma da Mangueira” que sobreviveram ao tempo. Tendo como representante o funcionário municipal Paulo Souza, o “Paulo Magro” (ou Paulo da Mangueira), o bloco era oriundo do bairro Cangalheiro, tendo sido fundado por volta de 1962. Além de representar o grupo, entre as décadas de 1960 e 1980, Paulo também escrevia os sambas-enredo de sua escola.

Como havia uma premiação ao bloco vencedor, cada equipe caprichava nas letras que seriam entoadas, bem como em suas indumentárias. A prefeitura concedia um apoio financeiro conforme o número de integrantes de cada bloco. Em 1981, o prefeito Numa Pompílio concedeu 30 mil cruzeiros à Turma da Mangueira, de Paulo, tendo em vista que essa contava com mais de 70 integrantes. Para o concurso desse ano, Paulo compôs o seguinte samba:

Com o samba-enredo acima, a “Turma da Mangueira” conquistou a segunda posição no concurso. O desfile ocorrido na terça-feira de carnaval, em frente ao prédio da Prefeitura, teve como banca julgadora: os professores Francisco Ângelo da Silva, Edmée Assunção, Filozinha Teixiera e Luis Carlos. O prêmio fora o montante de 8 mil cruzeiros.

Imagens da escola vencedora, “O Caveira”. Muito popular, “O Caveira” investia pesado nas fantasias de seus integrantes. Era um dos principais rivais da Turma da Mangueira.

No carnaval de 1983, seguindo a tradição, Paulo voltou a compor o samba daquele ano (imagem abaixo). Sempre citando as belezas e história de Caxias, as composições de Paulo eram uma atração à parte:

E a história continuou nos anos seguintes. Até que, com a popularização dos carnavais em clubes, os blocos e escolas de samba foram perdendo a força, até quase desaparecerem da folia carnavalesca de Caxias. Paulo da Mangueira, figura que, durante anos, dedicou-se às festividades, faleceu aos 81 anos no dia 15/08/18, deixando versos eternizados na memória de muitos foliões.


Fontes de pesquisa: Jornal O Pioneiro; Depoimento de Nonato Ressurreição

Imagens: Internet; Jornal O Pioneiro

Restauração e Colorização: Brunno G. Couto

Marcello Thadeu de Assumpção

Marcello Thadeu de Assumpção nasceu em Caxias, no dia 16/01/1917; filho de Antônio Thadeu de Assumpção e Guiomar Cruz Assumpção. Em sua cidade natal, iniciou os seus estudos primários no colégio da professora Quininha Pires, prosseguindo-os em São Luis, no Seminário Santo Antônio. Contudo, percebeu que a sua vocação era outra, optando por cursar Medicina.

Dessa forma, seguiu para Salvador, onde formou-se, em 1943, aos 26 anos de idade, pela Faculdade de Medicina da Bahia. No Rio de Janeiro, especializou-se – pela Universidade do Rio de Janeiro – em Obstetrícia, Ginecologia, Pediatria, Câncer Ginecológico e Doenças da Nutrição. Na Academia de Farmácia, aperfeiçoou-se em Bacteriologia e Imunologia. Estudo do mesmo nível, em relação a doenças da pele, frequentou o Departamento Nacional de Saúde.

Após formar-se, Marcello retornou à Caxias, onde passou a atender a população da cidade, principalmente os mais humildes. Em sua carreira médica, atuou no INPS, RFSA, Hospital Miron Pedreira, FSESP, Posto de Saúde do Estado e Casa de Saúde e Maternidade de Caxias. Atendia a todos sem distinção de qualquer natureza, onde quer que fosse necessário o seu serviço, e a qualquer hora. Na cidade, fundou, em 1960, o jornal Tribuna Caxiense, onde também ocupava a função de diretor.

Seguindo a sua vocação de servir aos seus conterrâneos, o médico candidata-se, em 1955, ao cargo de prefeito – não logrando êxito nessa primeira investida. No pleito de 1962, elege-se deputado estadual, pelo PDC (Partido Democrata Cristão). E nas eleições de 1969, apoiado pelo então prefeito, Aluízio Lobo, Marcello Thadeu é eleito prefeito de Caxias, para o pleito de 1970 à 1973; tendo como vice o empresário Elmary Machado Torres. Concluído o mandato, voltou às lides eleitorais e foi eleito vereador à Câmara de Caxias, de 1977 à 1982. Em 1982, voltou a eleger-se ao mesmo cargo, onde permaneceu de 1983 à 1988.

Além da carreira médica e política, Marcello Thadeu também dedicou-se ao magistério; função que exerceu com excelência. Atuando no Colégio Caxiense, lecionou nas cadeiras de: Latim, Francês, História Natural e Ciências. Nos colégios Diocesano e São José, também deu aulas de Latim e Francês.

Muito respeitado em todos os campos em que atuava, dr. Marcello realizou diversas benfeitorias à sua cidade. Sendo que a maior de suas obras fora, sem dúvidas, a Fundação Educacional Coelho Neto (FECON), criada em 1963, com sede própria, em moderno edifício constituído de amplas instalações, onde são ofertados cursos de 1 e 2 graus, e Jardim de Infância. Gozando de alto conceito perante a comunidade e autoridades locais, a instituição de ensino, localizada à rua Cel. Libânio Lobo, funciona até os dias de hoje.

Já idoso, o médico passou a residir em um imóvel localizado na Praça Gonçalves Dias. Local onde passava horas sentado, olhando o movimento da cidade. Marcello Thadeu, que não teve filhos, faleceu em sua terra natal, no dia 02/04/2002, aos 85 anos de idade.

Marcello Thadeu em fotografia da década de 1990.

Em sua memória, a sua família fundou, em 22/01/2008, o “Memorial Humanista Dr. Marcello Thadeu de Assumpção” localizado nas dependências do Colégio Coelho Neto; cujo o objetivo é preservar todo o acervo de objetos, móveis, fotos, documentos e instrumentos médicos, que recontam a vida desse ilustre caxiense. Além disso, o médico humanista também da nome a uma avenida da cidade.


Fontes de pesquisa: Livro Efemérides Caxienses/Autor: Arthur Almada Lima Filho; Jornal Cruzeiro; Jornal Nossa Terra; Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto

Imagens da postagem: Ac. do IHGC; Jornal Cruzeiro; Jornal Nossa Terra; Ac. Aluízio Lobo

Restauração e Colorização: Brunno G. Couto

Nereu Bittencourt

Nereu Bittencourt nasceu em Caxias, no dia 08/03/1880, filho de Maria José Bittencourt. Nereu estudou em São Paulo; tendo retornado, no início do século XX, ao seu estado natal, mais precisamente para a capital São Luis. Lá, fez parte da “Oficina dos Novos” ao lado de Vespasiano Ramos, seu ilustre patrício. Ainda na capital, foi professor do Colégio de Santana.

De volta à Caxias, em 1906 era auxiliar do Externato Benedito Leite, e, no ano subsequente, assumiu o cargo de diretor do Colégio Gonçalves Dias. Bem alto e bastante magro, Nereu, em 1908, casou-se com Erlinda de Oliveira Bittencourt. Junto aos filhos, o casal residiu em imóvel próprio à Rua Coelho Neto, no centro de Caxias. Aclamado professor de Português e Francês – além de lecionar aulas particulares em sua residência -, também ministrou aulas na Escola Normal e Ginásio Caxiense (sendo um de seus fundadores, bem como o compositor do hino da instituição). Na década de 1930, durante a administração do Interventor Paulo Ramos, Nereu fora nomeado Diretor da Biblioteca Benedito Leite (BBL).

Além de professor, Nereu também era poeta, tendo publicado diversas de suas poesias em jornais de Caxias e São Luis. Uma importante efeméride na biografia de Nereu Bittencourt ocorreu na década de 1940, quando houve uma tentativa de mudança nome da cidade de Caxias, que conflitava com a cidade homônima do estado do Rio Grande do Sul. Destarte, o então interventor em Caxias, Otávio Passos, procurou os intelectuais da cidade para obter uma opinião sobre a mudança. O professor Nereu destacou-se como uma das figuras contrárias à alteração; tendo, na oportunidade, redigido um extenso manifesto em defesa do nome “Caxias” para a terra maranhense. E conforme sabemos, Caxias-MA saiu vitoriosa na disputa, restando à cidade sulista, como forma de diferenciação, adotar a terminação “do Sul” em seu nome oficial.

Nereu não tinha uma vida apegada a bens materiais, tendo sempre vivido em um estilo de vida bem simples. Em 1961, com a ajuda de amigos e admiradores, publicou o livro “Poesias”. Muito estimado por sua sabedoria e retidão, Nereu Bittencourt faleceu em Caxias, no dia 11/06/1963, aos 83 anos de idade. Com o seu falecimento, o então vereador Oswaldo Marques propôs a mudança do nome da antiga Av. 15 de Novembro para Av. Nereu Bittencourt – nome que permanece até os dias de hoje. Além disso, Nereu é patrono da Cadeira de n. 16 da Academia Caxiense de Letras (ACL) e da Cadeira n. 2 do Instituto Histórico e Geográfico de Caxias (IHGC).


Fonte de pesquisa: Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto; Livro Efemérides Caxienses/Autor: Arthur Almada Lima Filho; Depoimento de Erlinda Bittencourt.

Imagem da Publicação: Ac. do IHGC

Restauração e Colorização: Brunno G. Couto

Sinhá Castelo

Filha de Antônio Vespasiano Ramos e Leonilia Caldas Ramos, Almerinda Caldas Ramos nasceu em Caxias – mais precisamente no largo da igreja de São Benedito -, no final do século XIX. Tinha mais dois irmãos: Heráclito e Vespasiano Ramos (um dos filhos mais ilustres de Caxias).

De sua juventude, quase nenhum registro chegou aos nossos dias. Ao que se sabe, a jovem, ao lado dos irmãos, passou grande parte da infância brincando no areal no largo de São Benedito; local, onde, da janela de casa, assistia aos memoráveis festejos do referido santo. No início do século XX, Almerinda conhece João Castelo Branco da Cruz, jovem proveniente de tradicional família caxiense. O casal oficializa a união no ano de 1904, em cerimônia realizada na princesa do sertão.

É ao casar-se com o coronel João Castelo que Almerinda passa a ser conhecida como Sinhá Castelo. O casal teve doze filhos, sendo eles: José Castelo Branco da Cruz, João Castelo Branco da Cruz Filho, Maria Antonieta Cruz Ribeiro Gonçalves, Lina Cruz de Amorim Coelho, Alice Castelo Cordeiro, Lauro Castelo Branco da Cruz, Luzia Castelo Branco da Cruz, Antônio Castelo Branco da Cruz, Berenice Castelo Branco da Cruz, Benjamim Castelo Branco, Carlos Castelo Branco da Cruz e Alba Castelo Branco.

A família passa a residir no histórico casarão da família Castelo Branco (próximo à praça do Thales Ribeiro), no centro de Caxias. Em 1947, João Castelo falece. Viúva, Sinhá Castelo passa a residir apenas com as filhas, que também habitavam o casarão da família. Por volta da década de 1970, Sinhá Castelo já estava com a saúde bastante fragilizada em virtude da avançada idade; vindo a falecer àquela década.

Filho de Maria Antonieta Castelo, e, por conseguinte, neto de Sinhá Castelo, o então governador do Maranhão, João Castelo Ribeiro Gonçalves, resolveu homenagear a avó ao dar o seu nome a um hospital inaugurado em Caxias. O inesquecível “Hospital Sinhá Castelo” funcionou por mais de trinta anos, tendo sido desativado nos anos 2000.


Fonte de pesquisa: Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto.

Imagem da publicação: Internet.