Sálvio Negreiros, o caxiense que foi um dos maiores ilustradores do Brasil

Salvio Correia Lima Negreiros nasceu em Caxias, em 31/08/1924, filho de Alice Correia Lima e Joaquim Negreiros. Tinha mais quatro irmãos: Áurea, Muriel, Júlio e Alberto. O seu pai era um conhecido comerciante de Caxias, sendo proprietário da popular “Casa J. Negreiros” , que localizava-se à Rua Aarão Reis, no centro da cidade.

Desde a infância, o desenho sempre fora a grande paixão do pequeno Sálvio. Começou rabiscando as calçadas com pedaços de carvão, com os diversos desenhos que lhe vinham à cabeça: cavalos, casas, bonecos, aviões etc. As pessoas que passavam por ele diziam: “Coitado! Esse, quando crescer não dará para nada…”. Quando as calçadas já não eram suficientes, acabou enchendo os cadernos da escola com mais e mais desenhos; firmando, pouco a pouco, o seu talento.

Em 1934, surge no Brasil, de propriedade de Adolfo Aizen, a revista Suplemento Juvenil, que foi a primeira publicação brasileira dedicada a quadrinhos de heróis e com personagens famosos das tiras de jornal norte-americanas, como Mandrake – O Mágico, Flash Gordon, Tarzan, além dos desenhos Disney, como Pato Donald e vários outros que fizeram parte da “Era de Ouro dos Quadrinhos”

Em Caxias, um exemplar da Suplemento Juvenil chega às mãos de Sálvio, e logo passa a ser o centro das atenções do jovem. Certo dia, ao folhear a revista, Sálvio deparou-se com um anúncio de um concurso de desenho. Tratava-se de fazer uma história em quadrinhos que tivesse como motivo a “Retirada da Laguna”, o feito histórico do General Camisão. O prêmio: 500.000, 00 réis. Entusiasmado, começou a esboçar o desenho, a idealizar os quadrinhos e a dar forma às figuras. Em pouco tempo estava pronto o trabalho; enviado, logo em seguida, para à redação do Suplemento Juvenil, no Rio de Janeiro.

Algum tempo depois, qual não fora a surpresa? Sálvio – então, com 16 anos de idade – ficara em primeiro lugar no concurso, entre os 25 inscritos, sendo a sua história publicada na edição do Suplemento Juvenil de 12 de junho de 1941. Em Caxias, ao receber a edição da revista, Sálvio não conseguia acreditar no que estava lendo.

Para achar mais incentivo artístico, Sálvio transferiu-se para São Luis. E lá, em 1942, tomou parte no Salão de Pintura com um quadro a óleo, tendo obtido o 2º lugar, ganhando uma medalha de prata.  A sua maior façanha, porém, teve início em 1943, quando Sálvio tinha apenas 19 anos. O episódio ocorreu quando de sua busca ao prêmio da Suplemento Juvenil no Rio de Janeiro, capital da República, à época. Acontece que, a sua viagem foi das mais acidentadas e cheia de episódios pitorescos. O itinerário foi o seguinte: saindo de São luis passou por Teresina, Fortaleza, Crato, Petrolina, Juazeiro, Pirapora, Belo Horizonte e daí para o Rio. Toda essa caminhada foi feita por trem, cavalo, jangadas, carro de boi, caminhão, “gaiola”; enfim, todos os meios de transportes possíveis. E o mais impressionante: tudo isso em 75 dias!

Mas todo esse esforço fora recompensado. Ao constatarem o talento e o esforço do jovem, os dirigentes do Suplemento Juvenil prometeram-lhe, além da premiação em dinheiro, um lugar no Departamento Artístico, tal como haviam feito com as outras pratas da casa, como Fernando Dias da Silva, Celso Barroso e Antônio Eusébio; todos, como Sálvio, vencedores de concursos idênticos.

E assim fora feito. Sálvio, após mudar-se para São Paulo (onde a editora tinha o seu estúdio), desenhou histórias de aventuras para a revista, durante vários anos. Além do trabalho com quadrinhos, Sálvio, através do “Studio Artenova” – da editora carioca de mesmo nome fundada em 1962 -, ficou muito conhecido por suas ilustrações para capas de obras literárias, bem como para o mercado publicitário (Nesse estúdio, Sálvio também era responsável pela direção de arte).

Amigo de Ziraldo, fez parte da primeira geração de quadrinistas brasileiros. “Convém informar aos leitores que eu conheci Fernando, Sálvio e Celso, junto com Monteiro Filho – que são os quatro maiores ilustradores que já apareceram depois na publicidade brasileira”, disse, em 1972, o criador do Menino Maluquinho.

Em 1971, Sálvio volta a residir, junto à sua família, no Rio de Janeiro. Cidade na qual veio a falecer, em 1991, vitimado por um câncer de próstata. O caxiense deixou esposa, filhos e três netos. Um de seus filhos, Carlos Negreiros – que, gentilmente, contribuiu para esta postagem -, seguiu passos semelhantes aos do pai, atuando profissionalmente com Diretor de Arte.


Fontes: Genealogia da Família Correia Lima; Suplemento Juvenil (Diversos Números); Blog Tiras Memory; Wikipédia; Informações cedidas por Carlos Negreiros

“Dona Sinhá” e “Seu Dá”, as homenagens de João do Vale e Luiz Gonzaga à Caxias

Quando Luiz Gonzaga pegou “um trem em Teresina pra São Luis do Maranhão”, as coisas não iam muito bem em sua carreira. Considerado algo démodé, nas décadas de 50 e 60, com a chegada da bossa-nova e, posteriormente, da Jovem Guarda, o baião do velho Gonzagão saíra dos holofotes. Foi um duro golpe ao experiente músico.

Contudo, diferentemente das demais regiões do Brasil, o Nordeste nunca abandonara o seu ilustre filho. Sabedor desse prestígio, Gonzaga, nesse período, excursionou, quase que exclusivamente, por cidades nordestinas. Fazendo parte desse itinerário, Caxias fora uma delas. Por contratação realizada pelo próspero empresário Alderico Jefferson da Silva, o músico veio à cidade, na década de 1950, em ocasião do aniversário de um dos negócios do contratante, o “Armazéns Caxias”. O show teve lugar em frente ao estabelecimento, nos arredores da praça Gonçalves Dias. Para hospedar Gonzaga, fora providenciado um quarto nas dependências do “Palace Hotel”, à Rua Afonso Pena.

A proprietária e administradora do hotel era a popular “dona Sinhá Serrath”, apelido de Rosa Amélia de Jesus Serrath. Nascida a 06 de setembro de 1889, poucas informações sobre a sua biografia chegaram aos nossos tempos. Mãe da célebre professora Dacy, d. Sinhá, sempre pitando cachimbo e adornada de joias, comandava aquele hotel desde a primeira metade do século XX. E fora ali, nos cômodos do Palace (amplo casarão colonial de numerosas janelas), que Luiz Gonzaga acomodou sua sanfona e “se arranchou” antes de sua apresentação em Caxias. No local, o músico ainda encontrou tempo para prosear e desfrutar de algumas doses de conhaque. Tudo por conta de Alderico.

Outro amigo e, neste caso, conterrâneo – ambos nascidos em Pedreiras (MA) – de Alderico era o também músico João do Vale. O artista, que já tinha algumas composições suas tocando pelo Brasil (nesse período, João ainda não havia assumido os vocais), fazia visitas recorrentes ao amigo comendador, em Caxias, que o ajudava financeiramente. Assim como Gonzaga, João, quando de suas vindas a Caxias, também passava pelo Palace. E assim, em 1962, narrando um percurso que fazia frequentemente, João do Vale escreveu a canção “De Teresina a São Luis”, onde, além de homenagear o amigo e “mecenas” Alderico, citava d. Sinhá Serrath, conhecida sua de longa data. Para entoar a canção, o escolhido não poderia ser outro: Luiz Gonzaga. Lançada pela RCA, a música é a quinta faixa do LP “Ô véio macho”.

Oficialmente, a canção é composição de João do Vale e Helena Gonzaga, então esposa de Luiz, que também assinou outras oito músicas. Contudo, segundo os entendedores "gonzaguianos", Helena não era compositora. "Era o próprio Luiz Gonzaga o autor das músicas, pois naquela época um artista não podia fazer parceria com outro sendo de gravadoras diferentes por questões de direitos autorais. Daí Helena entrou na jogada e foi nomeada pelo marido como 'Madame Baião'" (Fonte: Blog "Viva o Reio do Baião").Além disso, é muito provável que Luiz Gonzaga não tenha tido envolvimento direto na letra de "De Teresina a São Luis", tendo ficado com a parte de musicar e, posteriormente, gravar o xote. Contudo, esse ponto ainda é muito discutido. 

O xote que narra, como o próprio nome sugere, uma viagem de trem entre as duas capitais, faz menção a cinco cidades maranhenses: Caxias, Codó, Coroatá, Pedreiras e São Luis. A estrofe caxiense é a seguinte:

“Bom dia Caxias
Terra morena de Gonçalves Dias
Dona Sinhá avisa pra seu Dá
Que eu tô muito avexado
Dessa vez não vou ficar”

“Seu Dá” era Alderico. Como uma forma de autopromoção, reza a lenda de que a alcunha teria sido disseminada pelo próprio empresário que, ao comercializar os seus produtos, nada vendia, mas dava, de tão baratos que eram. À boca pequena, os seus desafetos chamavam-no de “Seu Toma”.

Ao contrário de “Seu Dá”, que todos sabiam se tratar de Alderico Silva, a outra personagem citada já fora motivo de confusões. Ocorre que, por muito tempo, acreditou-se que a “Dona Sinhá” mencionada na música seria a esposa de Alderico, Dinir Costa e Silva. Um erro até compreensível. Contudo, como vimos, a “Sinhá”, aqui, era outra.

Quando Luiz Gonzaga esteve novamente em Caxias, em 29 de maio de 1966, trazido pelo então prefeito Aluízio Lobo, o músico fez questão de deixar uma dedicatória ao amigo em um livro, de autoria de Sinval Sá, que narra sua história de vida. Na obra intitulada “O Sanfoneiro no Riacho da Brigida”, o músico escreveu: “Ao amigo Alderico Silva, com os cumprimentos de seu cantor, Luiz Gonzaga.” Nesse mesmo show, realizado na praça Vespasiano Ramos, os caxienses puderam presenciar um “Velho Lua” em plena forma, terminando o espetáculo com um recado aos que pensavam que o seu tempo já tinha passado. Fazendo menção à bossa-nova, a plenos pulmões o músico bradou: “A minha bossa eu também já fiz!”.


João do Vale, por sua vez, não parou com as homenagens ao conterrâneo. Até pela proximidade entre as cidades, suas visitas à Caxias eram bastante recorrentes, como destaca esta nota, abaixo:

Ainda na década de 1960, João compôs a música “Vou pra Caxias”. Desta vez, a letra era toda voltada à cidade. Citando as maravilhas naturais e os santos padroeiros, João intercalou o famoso refrão: “Não adianta/Aqui não fico/Vou pra Caxias, onde está seu Alderico. Além disso, a canção citava os dois filhos varões do empresário: Getúlio e Aldenir. Como intérprete, fora escolhido o paraense Ary Lobo.

Por nunca ter sido um bom administrador de suas finanças, João sempre viveu de forma bastante humilde, o que nunca lhe fora um problema. Certa vez, já com a saúde bastante debilitada por um AVC, o compositor foi questionado se havia sofrido muito em sua vida, o que, de pronto, respondeu: “se eu sofri eu não sei, porque eu gostava”.

Na década de 90, pouco antes de seu falecimento, João ainda vinha à Caxias visitar o velho amigo, Alderico, em seu palacete e, de quebra, receber aquele agrado monetário sempre muito bem-vindo.

E como tudo nessa vida passa, os protagonistas dessa história também já se foram. Contudo, como toda obra artística de qualidade, que desconhece a efemeridade, as músicas de João e Gonzaga eternizaram-se no cancioneiro popular. Provando mais uma vez que tudo que é bom sobrevive aos testes do tempo.


Fontes de pesquisa: Jornal do Maranhão; jornal “Folha de Caxias”; Blog “Viva o Rei do Baião”; Wikipédia; Texto “Momento Poética: Luiz Gonzaga, o Rei do Baião/Autor: Edmílson Sanches; Depoimento de Mário Gomes

Sinhá Castelo

Filha de Antônio Vespasiano Ramos e Leonilia Caldas Ramos, Almerinda Caldas Ramos nasceu em Caxias – mais precisamente no largo da igreja de São Benedito -, no final do século XIX. Tinha mais dois irmãos: Heráclito e Vespasiano Ramos (um dos filhos mais ilustres de Caxias).

De sua juventude, quase nenhum registro chegou aos nossos dias. Ao que se sabe, a jovem, ao lado dos irmãos, passou grande parte da infância brincando no areal no largo de São Benedito; local, onde, da janela de casa, assistia aos memoráveis festejos do referido santo. No início do século XX, Almerinda conhece João Castelo Branco da Cruz, jovem proveniente de tradicional família caxiense. O casal oficializa a união no ano de 1904, em cerimônia realizada na princesa do sertão.

É ao casar-se com o coronel João Castelo que Almerinda passa a ser conhecida como Sinhá Castelo. O casal teve doze filhos, sendo eles: José Castelo Branco da Cruz, João Castelo Branco da Cruz Filho, Maria Antonieta Cruz Ribeiro Gonçalves, Lina Cruz de Amorim Coelho, Alice Castelo Cordeiro, Lauro Castelo Branco da Cruz, Luzia Castelo Branco da Cruz, Antônio Castelo Branco da Cruz, Berenice Castelo Branco da Cruz, Benjamim Castelo Branco, Carlos Castelo Branco da Cruz e Alba Castelo Branco.

A família passa a residir no histórico casarão da família Castelo Branco (próximo à praça do Thales Ribeiro), no centro de Caxias. Em 1947, João Castelo falece. Viúva, Sinhá Castelo passa a residir apenas com as filhas, que também habitavam o casarão da família. Por volta da década de 1970, Sinhá Castelo já estava com a saúde bastante fragilizada em virtude da avançada idade; vindo a falecer àquela década.

Filho de Maria Antonieta Castelo, e, por conseguinte, neto de Sinhá Castelo, o então governador do Maranhão, João Castelo Ribeiro Gonçalves, resolveu homenagear a avó ao dar o seu nome a um hospital inaugurado em Caxias. O inesquecível “Hospital Sinhá Castelo” funcionou por mais de trinta anos, tendo sido desativado nos anos 2000.


Fonte de pesquisa: Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto.

Imagem da publicação: Internet.

Sérgio Torres

Sérgio Torres, na verdade, era o nome artístico adotado por Herbert Carvalho. Nascido em Caxias, no bairro Cangalheiro, Herbert era filho do empresário Nachor Carvalho, e, por conseguinte, irmão do engenheiro, professor e político, Jadhiel Carvalho.

Desde cedo o pequeno Herbert gostava de cantar. Atividade que não fazia apenas em casa, mas também nas festinhas em que era convidado e onde não faltava a constante solicitação: “Mais uma! Bis! ”. Até à sua profissionalização musical houve um fato marcante: a sua mudança para São Paulo, a fim de cursar a faculdade de engenharia.

Contudo, Herbert não conseguiu ser aprovado no vestibular, além disso, em decorrência da morte do pai, em 1962, a sua mesada acabara. E houve um encargo adicional: a necessidade de educar os irmãos, todos mais jovens que Herbert, o caçula com apenas 9 anos.

Ainda residindo em São Paulo, Herbert começou a cantar em uma boate, já com o nome artístico: Sérgio Torres. Lá, fora descoberto pelo jornalista Jorge Saldanha, que sugeriu ao jovem cantor que começasse a educar a voz. Apresentando-o a uma professora de canto, que deu aulas a Sérgio, durante um ano e meio. O jornalista ainda indicou Sérgio a Júlio Rosemberg, da TV Tupi; responsável pelo lançamento televisivo do jovem caxiense.

O ritmo em voga na década de 1960 era o conhecido “iê-iê-iê” (nome que surgiu em virtude do refrão chiclete da música She Loves You dos Beatles). No Brasil, a Jovem Guarda era a porta voz desse estilo musical, o que influenciou muito no repertório de Sérgio, que cantava desde Rossini Pinto a Roberto Carlos. Em 1967, depois de sete meses de viagem pelo interior do país, Sérgio decide ir ao Rio de Janeiro, que, segundo suas palavras “O artista pode ser conhecido em todo o Brasil, mas enquanto não for aclamado na Guanabara não terá alcançado a consagração”.

Jornal carioca destaca a aventura de Sérgio.

Mas nem tudo correu como o planejado. Com o mercado altamente competitivo, Sérgio não conseguiu o destaque que almejava. Até que, certo dia, é aconselhado a tentar uma carreira em Portugal. E lá foi Sérgio, com a cara e a coragem. Em terras portuguesas, o jovem consegue, finalmente, gravar o seu primeiro LP. Com o disco embaixo do braço, Sérgio retorna ao seu país de origem, apresentando-se às gravadoras como um cantor de sucesso em Portugal. Com essa estratégia, Sérgio, enfim, consegue o seu lugar no mercado nacional, e lança alguns LPs, como o: Sérgio Torres, sempre…sempre, pelo selo Beverly.

Ouça, abaixo, Sérgio Torres cantando a música Aline:

E assim, com uma história de dedicação e resiliência, o caxiense Sérgio Torres, ou melhor, Herbert Carvalho seguiu fazendo carreira até a data de seu falecimento, em São Paulo, onde residia.

Lp “Sempre…Sempre” completo:


Fontes de pesquisa: O Jornal (RJ); Nonato Ressurreição; Xico Ramos; Livro: Cartografias Invisíveis/Ano: 2015.

Restauração da imagem: Brunno G. Couto