THE BATS – Quando a beatlemania chegou à Caxias

Sexta-feira, 28 de outubro de 1966. Noite de festa no Cassino Caxiense. Depois de vários dias de espera, era chegada a ansiada hora. Finalmente, os jovens caxienses estavam assistindo ao show da popular banda paulista The Clevers. Com cabelos caindo na testa, terninhos padronizados e “atitude rock ‘n roll”, os garotos eram muito prafrentex à uma Caxias habituada aos costumes mais tradicionais. Resumindo: a banda era o bicho! Mora?

O grupo foi contratado para tocar em um dia especial: a reabertura do C.R.C. (Clube Recreativo Caxiense; denominação que o Cassino passou a ter na década de 1960), que agora estava sob nova administração, e inauguraria, na oportunidade, o seu novo balcão-frigorífico. E como fora noticiado em um jornal do período, o Cassino “agora era dirigido por uma turma de jovens vontadosos“. Fazendo jus a alarmada jovialidade, nada melhor que reabrir as portas do clube com uma banda que estava na crista da onda.

E assim se dera. Ao som de músicas como “Não acreditei” (vídeo abaixo), os jovens dançavam e cantavam em coro. Diversão pura. Mas, além da simples diversão, para um grupo de seis amigos, fãs da banda, que assistiam maravilhados ao espetáculo, aquele show representava algo mais: uma possibilidade; um antigo desejo. O sonho era possível.

Quem eram esses jovens? Eram eles: Ribamar Palhano (Riba), Francisco Santos (Chico), Paulo Correa, José Carlos Santos (irmão de Francisco Santos), Gerardo Vidigal (Taqueira) e Alderico. Todos na faixa dos 20, 21 anos, vindos de famílias tradicionais de Caxias (Zé Carlos e Francisco são naturais de Barra do Corda).

Ainda estudantes do, antigamente, chamado “segundo grau científico” no Colégio Diocesano (nessa época, a instituição ainda era exclusiva para meninos), os garotos, na hora do intervalo, já sabiam para onde deveriam ir: a sala de instrumentos. Ali mesmo improvisavam um som. Paulo assumia os vocais; para ele a música não era de todo estranha, afinal, era sobrinho do professor de Música Adelmo Guimarães (irmão do pe. Aderson). Riba e Gerardo também tinham o gosto pela música correndo nas veias, tendo em vista que seu bisavô, Raimundo Ferreira Vilanova, havia tido uma orquestra. E os outros garotos possuíam já alguma intimidade com alguns instrumentos, pois tocavam nos desfiles cívicos de 7 de setembro, do colégio.

Mas os minutos de intervalo não eram suficientes, o que levava os garotos a se reunirem à Praça Gonçalves Dias. Para o instrumental, o violão de Paulo bastava. Cantando os sucessos da época, os jovens ficavam até altas horas da noite nos bancos da praça. Era a época de bandas como The Beatles e The Beach Boys, para citar as internacionais. No Brasil, o ritmo conhecido como “iê, iê, iê” logo chegou às paradas do rádio, e nomes da Jovem Guarda, como Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Ronnie Cord e Wanderleia, não saiam da boca dos mais jovens. E essas foram algumas das inspirações para o sexteto de amigos.

Aquele show do The Clevers atiçou ainda mais a antiga vontade de montar uma banda de rock. No ano seguinte, em 1967, o grupo deu vida à ideia e começou a se organizar. A divisão de instrumentos foi a seguinte: Paulo assumiria os vocais e guitarra-solo; José Carlos, guitarra-base e segunda voz; Chico, contrabaixo e voz; Riba e Taqueira, bateria (um tocava a primeira parte da festa, enquanto o outro fazia percussão; na segunda parte da festa, revezavam). Alderico (filho da professora Miroca), devido a restrições impostas pela família, não pôde participar do grupo.

E qual seria o nome da banda? “The Bats” (Os Morcegos, em tradução literal) foi o escolhido. Com um nome internacional, o nome dos integrantes deveria ser em inglês, pensaram. Agora, Riba era “Mike”; Chico, “Francis”; Paulo, “Paul”; Zé Carlos, “Charles”; e Gerardo, “Snake”.

E os instrumentos? Nada que um improviso não resolvesse. Para tanto, contaram com os serviços de Mário Beleza, tradicional músico caxiense que também exercia o ofício de marceneiro. Seguindo as ideias apresentadas pelos jovens, Mário, como podia, dava vida aos instrumentos, já que não tinha muita experiência no ofício de luthier. No início, nem tudo saiu como o planejado. Os primeiros instrumentos produzidos por Beleza logo apresentaram problemas em sua confecção, o que impossibilitava o uso. Após os erros iniciais, as falhas foram sendo ajustadas. Já para a elétrica dos aparelhos – parte responsável pela saída do som nos amplificadores -, os amigos contaram com a ajuda de um técnico em rádio de nome Felipe.

Contando com o total apoio do presidente do Cassino, Getúlio Silva (filho do casal Alderico e Dinir), o The Bats poderia ensaiar nas dependências do clube, bem como realizaria sua primeira apresentação no local. Após as devidas preparações, enfim o grupo fez a sua apresentação de estreia, em uma noite de Sábado, nas dependências do Cassino. Já saudosos dos The Clevers, os caxienses foram, em peso, prestigiar os jovens estreantes. No repertório, covers dos artistas de sucesso da época (músicas de “Renato e Seus Blue Caps” eram recorrentes). Com o sucesso do show, foi marcada uma segunda apresentação para o dia seguinte, a ser realizada na AABB (que ainda funcionava no centro da cidade).

Com o êxito do grupo, Getúlio Silva se comprometeu a adquirir novos instrumentos à banda, que viriam de Fortaleza. Em contrapartida, o The Bats faria apresentações no restaurante (extinto na década de 1970) do balneário Veneza, o qual o bar era arrendado ao Cassino Caxiense. E assim se dera. Todo o sábado à noite, show no Cassino; Domingo, pela manhã até uma 15h, show na Veneza. Cumprindo a promessa, algum tempo depois, com a presença do então prefeito de Caxias, Aluízio Lobo, os novos instrumentos foram entregues aos músicos.

Após alguns shows, o The Bats já era sucesso na cidade. Sendo que, ao final de uma dessas apresentações, um empresário artístico foi procurá-los, oferecendo os seus serviços. Ambas as partes de acordo, negócio fechado. Com a entrada desse empresário, as coisas ficaram mais profissionais. Primeiro que o agenciador venderia a banda como sendo de São Luis, o que, a seu ver, facilitaria a contratação por outras praças. E a estratégia parece que deu resultados, já que o que antes era restrito à Caxias e região, passou a incluir no roteiro diversas cidades do Piauí e Maranhão (como: Presidente Dutra, Barra do Corda, São Domingos etc.). A logomarca do grupo, caracterizada por um morcego, além de estar presente no bumbo da bateria, foi pintada na Kombi que rodava com o grupo em shows nas outras cidades.

Para mostrar que levavam o sonho à sério, o quinteto providenciou “uniformes” para os shows, tal qual os grupos da época; sendo, estes, confeccionados pelos próprios familiares. De estampas floridas à jaquetas similares as dos Beatles, a banda ousava. Ribamar foi além. Inspirado em uma capa de disco de Roberto Carlos, pediu ao irmão Antônio, sapateiro, que fizesse uma bota idêntica à do cantor.

A cabeleira do grupo causou estranhamento aos menos habituados, haja vista a nota humorada emitida em um jornal da cidade: “Acredito que para se tocar guitarra ou seja lá o que diacho for de nada servem os cabelos. Mas eles [o grupo The Bats] são donos deles e naturalmente não querem servir de peruca para ninguém…”

Em determinada ocasião, o Cassino contratou uma banda de grande sucesso do Rio de Janeiro chamada “Ivanildo e Seu Conjunto”. Mas, para a surpresa dos organizadores, nada saiu como o esperado. Logo que a banda começou a tocar os primeiros acordes, os “pés-de-ouro” (dançantes) começaram a reclamar. Queriam algo que balançasse mais o esqueleto, afinal, eram tempos de rock! Não teve jeito, dispensada a banda, os Bats foram contratados para substituir o conjunto.

Foram meses intensos de apresentações, o que proporcionou aos jovens, além de uma renda razoável, muita diversão. E como tudo que é o bom dura pouco, com o The Bats não foi diferente. Após oito meses de carreira, chegava ao fim o grupo. Mas o término já era meio que esperado.

Objetivando concluir as suas respectivas formações acadêmicas, os amigos tiveram que se separar, já que cada um rumou para uma cidade diferente. Dos cinco, apenas Riba continuou em Caxias, onde integrou por algum tempo o conjunto Os Naturais – depois, mudou-se para São Luis.

Como muitos conjuntos caxienses da época, o The Bats, infelizmente, não deixou nenhum tipo de registro fonográfico. 

Hoje, mais de cinquenta anos após o encerramento do The Bats, muitos caxienses são saudosistas ao lembrar da banda. Já setentões, cada um dos cinco integrantes do grupo, atualmente vive em cidades diferentes do Brasil. Ao que se sabe, nenhum deu prosseguimento à carreira musical, e nunca mais reuniram-se após o fim da banda. Uma reunião já foi tentada pelos organizadores da tradicional festa da “Velha Guarda Caxiense”. Contudo, segundo Ribamar Palhano (quem eu entrevistei para essa matéria), o reencontro é improvável, não sendo possível por questões logísticas e pessoais de cada integrante. Torçamos para que, um dia, esse reencontro aconteça, nem que seja one night only!


Fontes de pesquisa: Depoimento cedido, gentilmente, por Ribamar Palhano; Livro “Cartografias Invisíveis”/Capítulo de autoria de Nonato Ressurreição; Jornal “Folha de Caxias”

Imagens da publicação: Créditos nas imagens

A competição esportiva realizada, em 1928, à Praça do Pantheon

Em comemoração a importante efeméride nacional, no dia 7 de setembro de 1928, às 5h, no Tiro de Guerra 155 houve alvorada e passeata dos soldados pelas ruas de Caxias. Às 6h, houve o hasteamento da bandeira nacional na sede do TG, tendo, na ocasião, discursado o professor Manoel Leitão.

Às 8h, realizou-se uma passeata cívica. E para o período da tarde, foram agendadas diversas competições esportivas a serem realizadas na então praça D. Pedro II (Atual Dias Carneiro, popular Pantheon). Naquele ano, a praça – que anteriormente chamava-se “Praça da Independência” – ainda não contava com o projeto paisagístico pelo qual ficou conhecida, limitando-se a uma grande área de areia, piçarra e grama, com diversas árvores de Mamorana, que providenciavam um sombreado àquele descampado. Era nessa área que eram realizados diferentes espetáculos artísticos (quando o circo chegava na cidade, era ali que se instalava) e partidas de futebol em Caxias.

Naquela tarde de setembro de 1928, o público disputava, aos trancos e barrancos, o melhor local para assistir as competições. Ante a ausência de instalações apropriadas, tudo ali área era muito improvisado, como relembrou o Juiz de Direito e outrora espectador Antônio Martins Filho: “Não havia nenhum arremedo de arquibancada, sendo que as pessoas ali presentes faziam uma espécie de footing, principalmente no lado da Praça, desde o Colégio das Freiras até os prédios da Prefeitura Municipal e da Cadeia Pública.”

As equipes que estavam disputando naquela tarde eram a do Jahú Sport Club e do Tiro de Guerra 155. Ao todo, foram realizadas 6 provas, sendo estes os resultados, conforme o periódico “A Escola”:

  • 1ª ProvaCabo de Guerra – Conquistada pelos rapazes do Jahú.
  • 2ª ProvaCarreira de Velocidade – Conquistada pelo conhecido “Voador” (Nesinho Abreu), do TG 155.
  • 3ª ProvaSalto em Altura – Conquistada por Domingos Leonar, do TG 155.
  • 4ª ProvaSalto em Largura – Conquistada por Domingos Leonar, do TG 155.
  • 5ª ProvaCorrida de Estafeta – Conquistada por Paulo Saldanha, do Jahú.
  • 6ª ProvaJogo de Futebol– Jahú Sport Club derrotou o TG 155, por 1×0.

Após as provas, a tradicional banda Carimã executou belíssimas peças de seu vasto repertório. Finalizando, assim, as festividades de 7 de setembro, daquele ano.

Vale lembrar que as competições esportivas em Caxias, antigamente, eram eventos bastantes comuns, a exemplo da realizada no balneário Veneza, em 1947.

Fontes de pesquisa: Jornal A Escola; Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Eziquio Barros Neto

Imagem da publicação: Ac. Dreyfus Azoubel/Álbum do Maranhão de 1950; Ac. de Emanuel Nunes de Almeida

Restauração, Colorização e Design das imagens: Brunno G. Couto

A antiga tradição da Malhação de Judas, em Caxias

Judas Iscariotes, que integrava o grupo de apóstolos de Jesus, foi o responsável por entregar Cristo aos soldados que o levaram para ser crucificado. Judas indicou Jesus com um beijo no rosto. Pela traição, o apóstolo recebeu 30 moedas de ouro. Após o ato, Judas entrou em desespero e enforcou-se. Esta passagem bíblica marca um dos maiores casos de traição da história da humanidade.

Um dia antes da Páscoa (celebração da Ressurreição de Jesus), acontece o Sábado de Aleluia, onde é celebrada a Vigília Pascoal, ocasião em que os fiéis cristãos se reúnem em constantes orações durante toda a madrugada que antecede o Domingo de Páscoa. Para a data, fora criado (de maneira não oficial no calendário católico) o ritual da malhação de Judas (também conhecido como “queima de Judas” ou “enforcamento de Judas”), tradição trazida pelos espanhóis e portugueses à toda América Latina.

“Há diversas hipóteses para o surgimento do ritual, uma delas é de que a malhação do boneco tenha origem nas religiões pagãs, a partir de cultos agrários e as festas da colheita. Durante essas ocasiões, o boneco representava uma divindade da vegetação e, por meio do fogo, haveria uma renovação da vida vegetal e garantia de boas colheitas. Esse ritual teria mudado de simbolismo a partir do sincretismo religioso, que unificou muitos rituais pagãos e cristãos ao longo do tempo.” (Trecho transcrito do site Imirante.com).

Em seu modo mais simplificado, o rito consiste na preparação de um boneco de pano, o qual representa o apóstolo traidor, a ser pendurado por uma corda (simbolizando o seu enforcamento), para posterior “malhação” com paus, bem como a sua queima.

Na primeira metade do século XIX, época de D.João VI e D.Pedro I, essa tradição era mais ritualizada e cenográfica, conforme escreveu o pintor francês Jean-Baptiste Debret: “O sentimento dos contrastes, que fecunda tão marcadamente o génio dos povos meridionais da Europa, encontra-se igualmente no brasileiro, caracterizando-se pela capacidade de fazer suceder ao espetáculo lamentável das cenas da paixão de Cristo, carregadas processionalmente durante a quaresma, o enforcamento solene do Judas no sábado de Aleluia.

Compassiva justiça que serve de pretexto a um fogo de artifício queimado às dez horas da manhã, no momento da Aleluia, e que põe em polvorosa toda a população do Rio de Janeiro entusiasmada por ver os pedaços inflamados desse apóstolo perverso espalhados pelo ar com a explosão das bombas e logo consumidos entre os vivas da multidão! Cena que se repete no mesmo instante em quase todas as casas da cidade.(…) E ao primeiro som de sino da Capela Imperial, anunciando a ressurreição do Cristo e ordenando o enforcamento do Judas, que esse duplo motivo de alegria se exprime a um tempo pelas detonações do fogo de artifício, as salvas da artilharia da marinha e dos fortes, os entusiásticos clamores do povo e o carrilhão de todas as igrejas da cidade.

Com o tempo, a tradição foi ganhando tons mais críticos/humorísticos e menos religiosos, conforme preceituou Câmara Cascudo: “Nos sábados de Aleluia rasgava-se um Judas de pano velho, papel e trapos no meio de assuadas. Dizia-se romper a Aleluia. Os Judas eram preparados secretamente e postos em lugares públicos e mesmo à porta de adversários políticos. O sr. Gustavo Barroso recorda que no Ceará fazia-se outrora um júri presidido por pessoa respeitável para julgá-lo. O veredito infalível condenava-o à forca. Na maioria dos casos o Judas trazia o seu ‘testamento’ em versos de pé quebrado, alusivo às pessoas da localidade, com intenções satíricas, políticas e menos humorística.”

Em Caxias, não se sabe ao certo a que ano remonta a introdução da tradição, já que, por não pertencer às datas oficiais do calendário católico, os seus registros quase que inexistem nos jornais da época. As lembranças que sobreviveram ao tempo remontam à década de 1940, sendo a tradição realizada em diferentes bairros da cidade.

Um dos mais famosos e antigos era o realizado no largo de São Benedito, nas imediações da praça Vespasiano Ramos, pelos seus moradores. Proprietário do “Bar Operário”, Herval Lobo era, naquela localidade, o responsável por preparar o boneco. Para tanto, enchia de palha uma roupa masculina, sendo acrescido um chapéu e uma máscara (ou pintura) para formar a cabeça. Para potencializar o espetáculo pirotécnico, Herval adicionava bombas de São João na região das coxas, braços e cabeça do boneco.

Além do Judas, também era redigido um testamento, onde o humor era a característica dominante. Nele, Judas “deixava” aos participantes de sua queima algumas “heranças” humoradas. Com o tempo, os bonecos passaram a servir como um crítica política, onde o Judas, ainda que de maneira não explícita, representava determinado político da época, e o testamento passou a ser endereçado aos demais desafetos.

Na década de 1960, o sr. Simba também ficou famoso por realizar a malhação do Judas à Rua Nossa Senhora de Fátima, em um evento que contava com uma grande presença de adultos e crianças. 

Já no início década de 1980, os responsáveis por manter a tradição no largo de São Benedito foram os clientes do bar “Recanto dos Poetas”, de Arthur Cunha, próximo ao bar do Herval. No memorável Sábado de Aleluia do ano de 1983, Rangel foi o responsável pela confecção do Judas.

Após, fazendo parte da tradição, o Judas foi “roubado”, sendo restituído pouco tempo depois. Conforme o jornalista Vitor Gonçalves Neto, o testamento daquele ano fora redigido pelo “Tales e o filho do Leitão”. Queimado com as bombas, do testamento sobrou apenas as duas humoradas quadras abaixo:

Para facilitar a queima, os clientes utilizaram a matéria-prima do bar: cachaça. Embebido no aguardente, foi fácil para o boneco entrar em chamas, sendo seguido pelas explosões das bombas instaladas em seu corpo. E para finalizar o que ainda restava de sua estrutura, as pauladas não foram poupadas. Não sobraram nem os sapatos para contar história.

Nas décadas seguintes, ainda era possível ver a tradição sendo mantida em alguns bairros da cidade, mesmo que em menor quantidade (a queima chegou a ser realizada em frente ao cemitério dos Remédios). Contudo, as pessoas mais velhas que mantinham viva a tradição foram morrendo e, por consequência, esta fora desaparecendo em Caxias. De tal forma que, atualmente, dificilmente – se é que ainda fazem – se ver esse histórico ritual sendo realizado nas ruas da cidade em Sábado de Aleluia.


Fontes de pesquisa: Sites – Rio de Janeiro Aqui/G1/Imirante; Depoimentos de Sebastiana Guimarães e João Oliveira; Jornal O Pioneiro

Imagens da publicação: Wikipédia; Google Imagens; Jornal O Pioneiro

Restauração e Design das imagens: Brunno G. Couto

Paulo Souza e os sambas-enredo da Turma da Mangueira

Nos carnavais caxienses de outrora, os blocos carnavalescos e escolas de samba eram tradição. Grupos como “Malucos por Samba”, “Os Caveiras”, “Os Caveiras do Samba”, “Turma da Mangueira”, “Unidos do Olho D’água”, “Unidos da Baixinha” eram figurinhas carimbadas nas festividades. Compostos por instrumentos de percussão, porta-bandeiras e passistas, esses blocos, que recebiam o apoio da prefeitura, desfilavam pelas ruas de Caxias no período de carnaval.

Pesquisando sobre o tema, deparei-me com dois sambas-enredo da “Turma da Mangueira” que sobreviveram ao tempo. Tendo como representante o funcionário municipal Paulo Souza, o “Paulo Magro” (ou Paulo da Mangueira), o bloco era oriundo do bairro Cangalheiro, tendo sido fundado por volta de 1962. Além de representar o grupo, entre as décadas de 1960 e 1980, Paulo também escrevia os sambas-enredo de sua escola.

Como havia uma premiação ao bloco vencedor, cada equipe caprichava nas letras que seriam entoadas, bem como em suas indumentárias. A prefeitura concedia um apoio financeiro conforme o número de integrantes de cada bloco. Em 1981, o prefeito Numa Pompílio concedeu 30 mil cruzeiros à Turma da Mangueira, de Paulo, tendo em vista que essa contava com mais de 70 integrantes. Para o concurso desse ano, Paulo compôs o seguinte samba:

Com o samba-enredo acima, a “Turma da Mangueira” conquistou a segunda posição no concurso. O desfile ocorrido na terça-feira de carnaval, em frente ao prédio da Prefeitura, teve como banca julgadora: os professores Francisco Ângelo da Silva, Edmée Assunção, Filozinha Teixiera e Luis Carlos. O prêmio fora o montante de 8 mil cruzeiros.

Imagens da escola vencedora, “O Caveira”. Muito popular, “O Caveira” investia pesado nas fantasias de seus integrantes. Era um dos principais rivais da Turma da Mangueira.

No carnaval de 1983, seguindo a tradição, Paulo voltou a compor o samba daquele ano (imagem abaixo). Sempre citando as belezas e história de Caxias, as composições de Paulo eram uma atração à parte:

E a história continuou nos anos seguintes. Até que, com a popularização dos carnavais em clubes, os blocos e escolas de samba foram perdendo a força, até quase desaparecerem da folia carnavalesca de Caxias. Paulo da Mangueira, figura que, durante anos, dedicou-se às festividades, faleceu aos 81 anos no dia 15/08/18, deixando versos eternizados na memória de muitos foliões.


Fontes de pesquisa: Jornal O Pioneiro; Depoimento de Nonato Ressurreição

Imagens: Internet; Jornal O Pioneiro

Restauração e Colorização: Brunno G. Couto

O antigo monumento da Praça do Panteon

Em 1923, ano em que comemorou-se o primeiro centenário da independência de Caxias, o prefeito Francisco Vilanova programou grandes solenidades a serem realizadas na cidade; destacando-se a inauguração, em 02 de agosto de 1923, no então Largo da Independência, de um marco simbolizando a importante efeméride – marco, esse, demolido anos depois.

Durante o primeiro mandato do tenente Aluízio Lobo (1966/1970) como prefeito de Caxias, o Largo da Independência – agora já renomeado para “praça do Panteon”-, que até então era um grande campo de grama e piçarra, passou por uma reforma radical. Com planta projetada pelo artista caxiense Mundico Santos, a área foi pavimentada, ganhando passeio, jardins, dois coretos, uma pequena arquibancada e um espelho d’água. E assim permaneceu até a década seguinte.

A então praça Pedro II (atual Dias Carneiro, popular Panteon), em fotografia de 1950; antes da mudança realizada pelo governo Aluízio Lobo.

Seguindo a tradição de 1923, em 1973 o prefeito José Castro decidiu realizar, no primeiro ano de seu mandato, a construção de um monumento simbólico ao aniversário de 150 anos da adesão de Caxias à independência. O local escolhido para a vindoura construção fora novamente o centro da praça do Panteon (Dias Carneiro); em substituição ao antigo espelho d’água.

E assim se dera, até que, em 01 de agosto de 1973, contando com a presença de populares e diversas autoridades de Caxias, a estrutura fora inaugurada. Projetado por Raimundo Mário Rocha, o obelisco em concreto (que recebeu o nome de “Monumento aos Heróis”) tinha a forma de uma grande flecha fincada, como que indicando que aquele era o local que outrora fora conhecido como Largo da Independência. Nada mais adequado. Em sua base de duas rampas, local onde muitas crianças subiam, localizavam-se duas placas comemorativas.

O monumento em 1973, ano de sua inauguração.

O monumento permaneceu naquele local até a primeira metade da década de 1990, quando, na administração do prefeito Paulo Marinho (1993/1996), a praça fora remodelada. Além da demolição dos coretos e arquibancada, o monumento também fora posto abaixo. Em seu lugar, fora construída uma fonte luminosa d’água (existente até os dias de hoje).

Diferentemente da atual estrutura, o antigo monumento fazia referência a uma importante data para Caxias, e que, sem dúvidas, merece ser lembrada.


Fontes de pesquisa: Biblioteca Benedito Leite; Livro Efemérides Caxienses/Autor: Arthur Almada Lima Filho; Livro Efemérides Caxienses/Autor: Eziquio Barros Neto

Imagens da publicação: Ac. Dreyfus Azoubel; Ac. Família Guimarães; Internet

Restauração: Brunno G. Couto

A história da Fábrica de Manufatura Caxiense (Atual Centro de Cultura)

Texto de Brunno G. Couto

“Se nós, aqui, não temos uma fábrica de fiação e tecelagem; Caxias, lá no interior, é que vai ter?!”. Ao ouvir, de empresários ludovicenses, essas palavras em tom de chacota, Francisco Dias Carneiro tomou aquela indagação como objetivo de vida. Rumou de volta à Caxias, e fundou, com a ajuda do povo, em 22 de outubro de 1889, a Companhia União Caxiense, que viria a ser proprietária, não de uma, mas três fábricas de fiação e tecelagem na cidade.

Dias Carneiro, aos 40 anos de idade.

Dias Carneiro havia ido a São Luis em busca de apoio empresarial para a sua futura empreitada. Contudo, como vimos, a viagem fora infrutífera. Ao retornar a Caxias, os caxienses, sabedores da luta de Carneiro, abraçaram a ideia e, mesmo com dinheiro insuficiente, levaram a cabo a fundação da sociedade. Primeiramente, em 01/01/1888, fora fundada a Fábrica Industrial Caxiense, a primeira fábrica têxtil do Maranhão. Posteriormente, veio a Fábrica União Caxiense, tendo suas obras iniciadas no final de 1889. Dias Carneiro, homem vitorioso, faleceu no ano de 1896 em Caxias .

“O processo de industrialização no Maranhão ocorreu no final do século XIX, com a instalação de varias unidades fabris especializadas no processamento da fibra de algodão, cuja cultura tem sido apontada como maior responsável pela ampla projeção econômica verificada nos séculos XVIII e XIX. O algodão serviu em grande escala como matéria prima para as fabricas têxteis do Maranhão. Nesse cenário, Caxias, que era uma das cidades mais populosa da província e grande produtora de algodão, chegou a exporta ‘para as praças da Europa, pelo porto de São Luís, ou para os grandes centros do sul, através do Piauí, Pernambuco e Bahia’ (COUTINHO, 2005, P.293), sendo pioneira no ramo têxtil no Estado do Maranhão”.

Em 1892, impulsionado pela febre das fábricas, chegou a vez da mais ambiciosa delas. Estabelecida, em 22/05/1892, a sociedade anônima denominada Companhia Manufatura Caxiense S/A, tinha como principais responsáveis os seus diretores fundadores: Segisnardo Aurélio de Moura, José Ferreira Guimarães (bisavô da atriz Glória Menezes), José Castelo Branco da Cruz e Antônio Bernardo Pinto Sobrinho. O local escolhido para a instalação da vindoura fábrica era distante das fábricas supracitadas, que localizavam-se no Ponte. A preferência foi por um terreno próximo a Estação Férrea Caxias – Cajazeiras , que vinha sendo construída, além da proximidade ao rio Itapecuru e seus portos muito movimentados.

Como o terreno escolhido era alagadiço, houve uma demora até que fosse realizada a drenagem do solo, sendo lançada a sua pedra fundamental no início de 1893. A nova fábrica teve o capital inicial 850 contos de réis, de 260 acionistas, que subscreveram 2.834 ações; sem qualquer incentivo do Estado. O projeto arquitetônico ficou a cargo do engenheiro Palmério Cantanhede, que, em virtude do acompanhamento das obras, residiu em Caxias por 18 meses. As estruturas metálicas foram importadas dos Estados Unidos e da Inglaterra, sendo transportadas pelo mar até São Luis, e, de lá, pelo rio Itapecuru até Caxias. As telhas vieram da França.

Detalhe da parte interna do teto da fabrica. Ano da imagem: 2020.
Detalhe interno da chaminé. Ano da imagem: 2020.

Um ano depois, o prédio estava quase concluído, estando todo coberto; a chaminé, de 38 metros de altura, estava finalizada e as caldeiras instaladas. Não obstante, ainda levara alguns anos para a sua finalização. Até que, em 18/09/1898, a fábrica é, enfim, inaugurada. Recebendo o nome de “Fábrica Gonçalves Dias”. A cerimônia de inauguração teve início às 10h, contando com uma grande número de presentes. Realizando a benção do novo prédio, estava o o vigário da Igreja de São Benedito, José Ewerton Tavares. Serviam de paraninfos os senhores: Comendador Francisco de Britto Pereira; Capitão Lionídio Britto Lima dos Reis; Joaquim Barbosa Caldas e Joaquim José Pinto de Moura.

A Fábrica em fotografia de 1908.

Após um longo e belo discurso do padre, o Tenente-Coronel Manoel Gonçalves Pedreira (pai do médico Miron Pedreira), na qualidade de chefe do poder executivo municipal, surgiu no local em que via-se uma fita de cor verde prendendo o volante do motor. Após improvisar um discurso – onde lembrou os serviços prestados por Dias Carneiro (já falecido), Custódio Santos e José Ferreira Guimarães à economia de Caxias – muniu-se de uma tesoura (oferecida pelo coronel José Castelo da Cruz) e cortou a faixa, declarando inaugurada a nova fábrica de manufatura de Caxias, a Fábrica Gonçalves Dias.

Assim que a fita simbólica fora cortada, imediatamente todos os mecanismos entraram em funcionamento, para a admiração dos presentes. Concomitantemente, é executado, pela banda do maestro Carimã Junior, o hino nacional. Após as solenidades programadas, os visitantes puderem visitar as instalações da fábrica. A visão deles foi a seguinte:

Ao lado da porta principal do escritório, viam-se duas árvores de algodão, contendo uma as maçãs e outras os capulhos da preciosa fibra. Mais adiante, ao adentrarem um dos compartimentos da fábrica, viram: algodão em caroço e em pluma; rolos já empastados, fios em maçarocas e carretéis. 

Além disso, morins de diferentes marcas e larguras, em fardos de dez peças; cretones, mesclinas, brins de várias cores; e toalhas, que ocupavam todo o espaço do vasto compartimento. Nos lados superiores das paredes, pendiam cortinas encimadas por escudos com as cores nacionais, nos quais liam-se os nomes dos diversos municípios do Maranhão. 

Toda essa ornamentação fora produzida pelo maquinário da própria fábrica, que fora importado da casa comercial Sons & Co., de Henry Rogers, localizada na cidade de Wolverhampton, na Inglaterra. 
Parte interna da torre.

O industrial Zezinho Guimarães.

Passando por dificuldades financeiras, a Fábrica Gonçalves Dias teve vida curta, fechando as portas em 1901, três anos após a sua inauguração. Sendo vendida, em 1902, em um leilão judicial por 40 contos de réis para o Banco da República, o credor hipotecário. No ano seguinte, a Companhia União Caxiense, proprietária da Fábrica União e da Fábrica Industrial, assume o seu controle até o ano de 1919, quando dois comerciantes teresinenses arrendaram-na. Em 1923, a fábrica a Companhia União Caxiense assume novamente o seu controle, sendo o comerciante Zezinho Guimarães (filho de José Ferreira Guimarães) o seu maior acionista. O industrial controla a Manufatura até 1944, quando transfere-a a um grupo paulista sob a liderança de José de Agustinis. Até que, em 1958, a Fábrica de Manufatura encerra, de vez, as suas atividades.

A fábrica em pleno funcionamento, por volta do ano de 1920.

Desde o seu encerramento, o prédio da fábrica permaneceu sem utilização. Correndo o risco de ser desmontado, o prédio estava em completo abandono quando, em 1977, o prefeito Aluízio Lobo incorpora o imóvel ao município; sendo, em 1980, revitalizada as suas dependências para abrigar o Centro de Cultura Acadêmico José Sarney.

Década de 1970. Após anos desativado, o prédio começa a passar por reformas para abrigar o vindouro Centro de Cultura.


Nesse mesmo ano, é realizado o tombamento do prédio pelo Estado, conforme o Decreto Estadual n. 7.660, de 30 de agosto. Desde então, o prédio já abrigou teatro, biblioteca, museu, exposições, artesanato, arquivo municipal e lojas. Além disso, vem recebendo diversos órgãos públicos, agências bancárias, e, até mesmo – de forma provisória – escolas.

Um dos mais icônicos símbolos de Caxias, em 08 de setembro de 2021 o prédio, de estilo neoclássico, completou 123 anos de história.

O prédio em fotografia recente.

Abaixo, um comparativo da fábrica no anos de 1920 e 2012. Para visualizar, arraste a bolinha central para os lados:


Fontes de pesquisa: Jornal de Caxias; Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto; Artigo “A participação das Mulheres no Espaço Têxtil e sua Contribuição nos Aspectos Econômicos de Caxias – MA”/Autoras: Ana Carolina de Azevedo e Raquel dos Santos Lima

Imagens da publicação: Ac. de Eziquio Neto; Youtube; Ac. de David Sousa; Álbum do Maranhão de 1908; internet; Site da prefeitura de Caxias; Google Maps

Colorização e Restauração: Brunno G. Couto

A história do Cine-Rex, o cinema mais longevo de Caxias

Texto de Brunno G. Couto

O memorável Cine-Rex fora fundado em Caxias no dia 28 de setembro de 1935, e teve como primeira instalação um prédio localizado na Praça Gonçalves Dias, de esquina, em diagonal com o imóvel onde, atualmente, funciona o Banco Bradesco. Não se sabe ao certo se o Cine-Rex fazia parte de uma rede nacional de cinemas, já que, em outros cidades, existiam salas de cinema com o mesmo nome – a exemplo de São Luis, Rio de Janeiro e Teresina. Ressaltando-se que, o Cine-Rex, de Caxias, é mais antigo que o da capital piauiense, que fora fundado em 29 de novembro de 1939.

Pouco tempo após sua criação em Caxias, o seu proprietário, Pedro Costa, resolveu fechá-lo, em virtude das dificuldades de conseguir bons filmes, nas cidades de Teresina e São Luis. As sessões, duas vezes por semana, dias de quarta-feira e de domingo, eram pouco frequentadas e o negócio, como negócio, cada vez mais se tornava precário.

Vendo a difícil situação, o empresário Antônio Martins Filho resolve arrendar o Cine-Rex; que passa a funcionar sob sua responsabilidade. Como primeira medida, muda o cinema de prédio, transferindo-o à Rua Aarão Reis, em um imóvel alugado (onde, anos depois, funcionou a agência do extinto Banco Bamerindus). Por sorte, Martins conseguiu bons filmes, preto e branco, o que provocou um aumento no número de espectadores.

O imóvel de cor laranja e amarelo foi a segunda instalação do Cine-Rex, à Rua Aarão Reis. O cinema funcionou nesse local até o ano de 1939, quando deslocou-se para a Rua Afonso Cunha. Ano da imagem: 2012.

Mas, essa situação durou pouco e logo Martins Filho resolveu passar o negócio para frente, já que não vinha lhe trazendo lucros, bem como atrapalhava os seus outros negócios comerciais. Dessa forma, passa o estabelecimento para o primo de sua mulher, o cirurgião-dentista caxiense Manoel Joaquim de Carvalho Neto, para que este assumisse a responsabilidade pelo restante de seu contrato de arrendamento. E é sob a direção de Carvalho Neto que o cinema começa a prosperar.

De sucesso imediato, os preços dos ingressos do novo cinema, em 1935, tinham o valor máximo de 2.000 réis (para os operários das fábricas locais, era cobrado o valor especial de 1.000 réis) . No ano seguinte, em 1936, a Assembleia Legislativa do Estado publicou no Diário Oficial: “Decretando e promulgando a lei que isenta de impostos de indústria e profissão, pelo prazo 10 anos, a Empresa Cinematográfica Falada ‘Cine-Rex’, de Caxias”. O destaque para o “Falada” se dava pelo fato de o som ter chegado ao cinema há menos de dez anos da data da publicação (foi implementado em 1927, com o filme “O Cantor de Jazz”).


Cine-Rex no dia da inauguração de sua sede à Rua Afonso Cunha.

Passados alguns anos em funcionamento à Rua Aarão Reis, Carvalho Neto decide transferir o seu cinema para um prédio próprio localizado na Rua Afonso Cunha (Calçadão). O imóvel, de arquitetura Art Decó, fora inaugurado em 28 de setembro de 1939. Contando com a presença de centenas de caxienses, a sessão inaugural exibiu o filme Rose Marie, de 1936, com os astros  Jeanette MacDonald e Nelson Eddy.

O novo prédio tinha cinco portas pantográficas, sendo que, na central localizava-se a bilheteria. Em sua sala de espera, encimando a parede, haviam retratos pintados dos astros da época, como Gary Cooper, Errol Flynn, Diana Durbim e Lana Turner. Com um total de 524 cadeiras, divididas por três fileiras (oito centrais e quatro laterais), o Rex tinha a sua tela posicionada em sentido contrário à sua entrada.

Logo abaixo de sua marquise, o Cine-Rex anunciava, em cavaletes, os cartazes dos filmes em exibição; bem como na esquina da Rua Afonso Cunha. Em uma era pré-trailers, o Rex colocava em sua antessala um quadro de cortiça exibindo lobby cards, em preto e branco, contendo algumas cenas dos filmes, para que, assim, o público tivesse uma noção maior do que iria assistir. As cadeiras, em madeira, eram reclináveis. A sala contava também com alguns ventiladores estrategicamente posicionados, mas que nem sempre amenizavam o calor inclemente de Caxias.

Alunos observam o cartaz posicionado na Praça Gonçalves Dias (à esquerda). Outros observam o cartaz, do Rex, do filme “Durango Kid – Barranco da Morte”, na esquina da Rua Afonso Cunha. Imagem da década de 1950.

Em seus primeiros anos, mais precisamente na segunda metade da década de 1940, o Cine-Rex sofria com o precário fornecimento de energia elétrica, que acabava prejudicando as sessões vesperais de Domingo. Ocorre que, nessa época, Caxias dispunha de luz das 18h até meia noite – um apito avisava o início e o fim da claridade. As caldeiras a vapor da Usina Dias Carneiro não aguentavam o dia todo e seus operários procuravam fazer um esforço adicional nas tardes de domingo, para alegria dos adeptos da sétima arte. Relembrando os tempos de criança, quem nos conta sobre essa passagem é o caxiense Antônio Augusto Ribeiro Brandão: ”

[Domingo] Depois do almoço, lá pelas duas horas da tarde, lá íamos nós em direção à Usina, a fim de incentivarmos os operários já empenhados, desde o meio-dia, na ‘alimentação’ das caldeiras, que precisavam de certo nível de pressão à custa de muita lenha e carvão. 

Essa operação levava tempo e podia fracassar, pois nem sempre os motores funcionavam na primeira tentativa de liberação dessa pressão a vapor. E aí, se tal acontecesse, tudo tinha de começar de novo e a vesperal daquele dia certamente ficaria para o próximo domingo, e ninguém suportava mais esperar para ver o resultado da célebre frase “voltem na próxima semana” exibida no seriado. 

Para que os motores funcionassem da primeira vez, contudo, também valia a torcida: aqueles garotos vidrados em cinema ficavam postados literalmente na ‘boca’ da caldeira, quase que encarnados nos homens suarentos pelo esforço de cada vez mais lenha e carvão. E tome pressão, e todos de olho no seu medidor; quando começava a chiar, acusando nível suficiente, era hora de transferir essa pressão para as engrenagens do motor, que havia de gerar a tão esperada luz. 

Na medida em que o vapor da caldeira ia sendo liberado, as correias começavam a deslizar e ir-e-vir pelas grandes rodas do motor, que dava seus primeiros sinais de vida e aos poucos ia acelerando seus movimentos, cada vez mais rápidos até que atingisse o nível adequado à geração da tão esperada luz. Às vezes todo esse esforço era em vão e o motor não conseguia ‘pegar’, e o processo deveria ser repetido; mas quando tudo dava certo, as palmas e os gritos ensurdecedores daquela torcida ensandecida saudavam as lâmpadas que se acendiam, em uma luminosidade cada vez mais forte. 

A seguir, em desabalada carreira, depois daquela enorme conjugação positiva de pensamentos e ações, tomávamos o rumo do cinema, anunciando a boa nova pelo caminho: chegou a luz! Depois, já acomodados nas poltronas de madeira e, de preferência, próximos a um dos ventiladores, suados e exaustos, dali em diante estaríamos atentos à telinha mágica, para aplaudir a vesperal daquele domingo. 

E assim que o prefixo musical começava a tocar, um famoso ‘dobrado’ dos tempos da Guerra, e as luzes iam diminuindo de intensidade até se apagarem por completo, todos gritavam como se fossem participar do maior espetáculo da terra.

Na década de 1940, o Cine-Rex rivalizava com o Cine-Pax, de Valdenor Lobo, que funcionava no antigo prédio do Rex à Rua Aarão Reis. E, diferentemente do Rex que priorizava os faroestes (como os seriados do cowboy Wild Bill Elliott) e musicais, o Pax dava preferência às comédias românticas.

“Às terças-feiras era o grande dia da ‘Sessão das Moças’, no Rex, um famoso apelo aos jovens da cidade e seus amores, que adentravam a sala de exibições à vista dos que já estavam sentados. Um verdadeiro desfile de modas!” relembra Brandão.

Com o tempo, as latas com as películas passaram a vir, em sua maioria, do Cine-Rex, de Teresina, que, objetivando baratear os custos, as buscava em Recife (PE) – capital que realizava a distribuição de todo o Nordeste -, e redistribuía para as cidades do interior do Maranhão e Piauí. Contudo, esse procedimento não era de todo benéfico, tendo em vista que as películas, exibidas diversas vezes em Teresina antes de aportar na princesa do sertão, acabavam muitas vezes chegando comprometidas, nos quesitos de som e imagem, devido ao uso excessivo.

Após suas estreias nos EUA, os filmes demoravam geralmente um ano para chegar ao Brasil. Isso para as grandes capitais. Nas cidades do interior, esse tempo era mais longo. 

As salas contavam com dois projetores à carvão que aos poucos era consumido. A necessidade de dois projetores, se dava pelo fato de que, no começo, a projeção em cada máquina estava restrita a 20 minutos, que era o tempo de consumo do carvão. Após esse tempo, o projecionista realizava a projeção na segunda máquina, enquanto era realizada a troca do carvão da outra. Os espectadores mais atentos conseguiam notar uma bolinha que aparecia piscando no canto da tela, sinal feito na película (muitas vezes, feito com a ponta do cigarro) pelo projecionista, que indicava o momento da troca de projetor. Contudo, nem sempre o projecionista estava 100% atento, o que acabava deixando a tela branca por alguns minutos, gerando uma gritaria e batida de pés do público na sala de exibição. Os gritos de “quero meu ingresso de volta!” não eram poupados.

Além dos longas-metragens, por volta das décadas de 1940 e 50 também eram muito populares os chamados “seriados” (exibidos após os filmes), que nada mais eram que versões arcaicas, geralmente de 15 episódios, das séries de televisão como conhecemos atualmente. Contudo, havia uma “pequena” diferença. Quando o episódio atingia o seu clímax – geralmente, quando onde o herói estava em alguma situação de perigo – , aparecia a seguinte mensagem na tela: “Não perca o próximo episódio. Semana que vem, neste cinema”. Se o espectador quisesse acompanhar o desenrolar da trama, deveria, nas semanas seguintes, desembolsar os valores dos demais ingressos. Em Caxias, um dos seriados mais famosos foi A Legião do Zorro, lançado originalmente em 1939; tinha 12 episódios. Para os mais curiosos, segue, abaixo, o primeiro episódio dessa cine-série:

No início da década de 1960, o Rex ainda sofria com problemas de fornecimento de energia elétrica. Talvez esse seja o motivo que o levou a funcionar, por um curto período, à Rua Afonso Pena. Em seu material publicitário o cinema passou a emitir o seguinte aviso: “A Empresa avisa que as sessões com intervalos são motivadas pela energia insuficiente para ligar as duas máquinas de projeção”. Em 26/09/1962, saiu uma nota no jornal “Nossa Terra” acerca do assunto: “Voltará a funcionar em breve essa casa diversional [Cine-Rex], com energia própria, segundo nos informou, em palestra, o seu proprietário. Dr. Carvalho Neto, já em entendimento com a praça de Recife para aquisição do material apropriado.”

Filmes como Du Barry Was a Lady (1943), Candelabro Italiano (1962), A Noviça Rebelde (1965), Spartacus (1960) e Dio, come ti amo! (1966) fizeram grande sucesso na sala do Rex. As belas estrelas do cinema italiano, a exemplo de Sophia Loren, arrebataram os corações dos adolescentes daquela época. Os clássicos bangue-bangues, bem como os filmes de kung-fu também eram a sensação. Para as crianças, haviam os desenhos (a grande maioria, dos estúdios Disney). Ao que se sabe, as películas eram, majoritariamente, dubladas.

Possivelmente, o período de maior popularidade do Cine-Rex tenha sido nas décadas de 1960 e 70. Ao menos, são os anos que mais permeiam a memória dos caxienses mais saudosistas. É por volta dessa época que começam a surgir os seus funcionários mais lembrados: Dona Maria Amélia, na bilheteria; Francisco Carvalho (Chico do Cinema), na portaria; Natan, na projeção; Alicate, recolhendo os bilhetes e colocando os cartazes dos filmes; dentre outros, cujo os nomes não foi possível lembrar.

“Havia um momento chamado de ‘a hora dos miseráveis’: próximo ao fim do filme, o Chico liberava e permitia a entrada dos que ficavam ali à espera” relembra Edimilson Sanches. À porta do cinema, ficava um senhor vendendo deliciosas balas de frutas aos espectadores. Na sala de exibição, também passava um jovem com um tabuleiro preso ao pescoço vendendo mais guloseimas. As balas de hortelã Mentex e Pipper eram as favoritas dos jovens.

Nesse período, os filmes ficavam em cartaz, geralmente, por dois dias (dependendo da receptividade ficavam até por, no máximo, uma semana), em sessões de 18:30 e 20:30. No Domingo, havia o matinal, de 10h às 12h; a vesperal, de 16h às 18h; e as sessões normais de 18:30 e 20:30. 

Quinta-feira era o dia de esteia de novos filmes, que ficavam em cartaz até a segunda, quando era realizada a renovação do catálogo.

Devido a sua grande quantidade de poltronas, bem como em virtude de seu palco, o Rex, além de cinema, também servia como o espaço de reunião do Centro Cultural Coelho Neto, uma sociedade que reunia diversos intelectuais caxienses. Além disso, muitos artistas locais e nacionais realizaram apresentações musicais em suas dependências.

Programação do Cine-Rex publicada no jornal Nossa Terra, no ano de 1961

Em 1967, o Armazém Paraíba chega a Caxias, e, para a sua instalação, adquiri os imóveis contíguos ao Cine-Rex. A empresa chegou, inclusive, a fazer ações em que realizava sessões gratuitas no Rex (imagem abaixo). Passados alguns anos, em novembro de 1980, visando uma expansão futura de sua filial, adquiri o imóvel do Cine-Rex, junto ao empresário Carvalho Neto. Destarte, o Rex passou a ser propriedade do empresário piauiense João Claudino Fernandes, que deu continuidade ao cinema – ainda que o ramo cinematográfico não fosse de seu interesse.

Ação do Armazém Paraíba junto ao Cine-Rex, no ano de 1973.

Até que, em maio de 1981, o Paraíba começa a expandir a suas instalações, e emite o aviso de que no prédio do Cine-Rex passará a funcionar a sua loja de móveis usados. O comunicado gerou grande comoção em Caxias, já que a cidade ficaria sem cinema. Contudo, o Armazém Paraíba logo informou que todo o maquinário e mobília do Rex estavam sendo vendidos para os srs. Santino Caldas Moreira e Sebastião Ferreira da Silva, que fundariam um novo cinema nas instalações do Palácio do Comércio (onde, anteriormente, havia funcionado o Cine-Glória).

E assim fora feito, no dia 11 de julho de 1981 era inaugurado o Cine-Alvorada, que contava com 400 cadeiras e 10 ventiladores, sendo “Alien – O Oitavo Passageiro” a película de estreia.

Dessa forma, com a demolição de sua estrutura, chegava ao fim inesquecível Cine-Rex, após mais de quarenta anos de história. Sendo, até hoje, o cinema mais longevo de Caxias.


Fontes de pesquisa: Depoimentos de Sebastiana Guimarães; Antônio Augusto Brandão; Joaquim Vilanova Assunção; João Oliveira; Nonato Ressurreição; Jornal O Imparcial; Jornal Cruzeiro; Jornal O Pioneiro; Jornal Nossa Terra; Livro Cartografias Invisíveis/Vários Autores; Site de Eziquio Barros Neto; Canal do YouTube de Marden Machado

Imagens da publicação: Internet; Google Maps; Jornal O Cruzeiro; Ac. IBGE; Facebook; Jornal Nossa Terra; Jornal O Pioneiro; Ac. de Silas Marques Jr.

Restauração e Design de imagens: Brunno G. Couto

A história da Euterpe Carimã, a primeira banda marcial de Caxias

Antônio Marcellino Rodrigues Carimã Junior

Não se sabe ao certo o nome do fundador da Euterpe caxiense. Consta, entretanto, tratar-se de um padre. Por outra lado, há documentação exata da data de início de sua vida social: 16 de novembro de 1848, uma quinta-feira. Os seus componentes iniciais eram a seleção dos melhores músicos da cidade, alguns pertencentes a alta sociedade local. Motivos diversos, porém, levaram-na a pleno declínio em começos de 1870.

Nesse período, chega à Caxias o hábil alfaiate e apreciado musicista ludovicense Antônio Marcellino Rodrigues Carimã Junior. Rapaz novo e orgulhoso proprietário de um Stradivarious, que tomou para si o encargo de reorganizar a “Euterpe”. Para tamanha empreitada, juntou-se ao clarinetista Antônio de Sousa Coutinho, que fora seu mestre e com quem repartiu os louros e os dissabores da empresa. Com essa restruturação, a Euterpe passou a se chamar “Euterpe Carimã”, em homenagem ao seu comandante .

Curiosidade: O aclamado maestro caxiense Elpídio Pereira recebeu as primeiras lições de música nas salas de ensaio da Euterpe Carimã.
Antônio Carimã, afilhado.

Primeiramente, a Euterpe era somente uma banda de músicas marciais, apenas na virada do século é que a Orquestra é posta em ação. Em 19/04/1907, morreu Antônio Carimã Junior; o músico – que também era agente dos Correios de Caxias – contava com mais de 60 anos de idade e era solteiro. Com a morte do amigo, Coutinho passou o comando da Euterpe a Antônio Carimã, afilhado, que não desmereceu a confiança. A sua gestão, porém, foi curta, haja vista o seu falecimento em 09/07/1913.

Sem direção, os músicos decidiram passar a chefia a uma tradicional família caxiense de músicos, representada nas pessoas do trombonista Alfredo Beleza e de seu irmão Mário Pinho, soprano.

Em 1928, a Euterpe Carimã comemorou o seu 81 aniversário, sendo realizada uma grande festa nas dependências do Teatro Fênix. Esse período foi o auge da orquestra, onde realizou apresentações por diversas cidades do Maranhão e Piauí. O seu repertório era vastíssimo, sendo composto de trechos clássicos às últimas novidades musicais, bem como composições locais. Em sua primeira excursão a São Luis, em julho de 1929, a Euterpe apresentou-se em praça pública e no Teatro Arthur Azevedo.

Após a aclamada apresentação no Teatro Arthur Azevedo, no dia 29/07/1929, o povo entusiasmado acompanhou a Euterpe Carimã até o quartel da Força Policial, erguendo vivas a Caxias e a seus músicos.
Fotografia da Euterpe Carimã, no ano de 1928.

Nesse período a Euterpe era composta por 24 músicos (imagem abaixo) divididos nos seguintes instrumentos: violino A e B; saxofone, alto bemol e soprano; clarinete, piston, trombone, contrabaixo de metal, bateria, xilofone, pandeiro, flauta e flautim.

*Devido a um erro de digitação, o nome de um dos músicos acabou saindo errado. A grafia correta é “Canário”.


Em 1936, a Euterpe Carimã sofre uma grande perda. Na ocasião, os músicos estavam a bordo da lancha “Itamar” que partia de Colinas à Caxias. Por alguma razão desconhecida, a embarcação envolveu-se em um acidente. O desastre acabou tirando a vida do músico Benedito dos Santos, vulgo Camburão, que morreu afogado.

Em 1937, com o falecimento do Mestre Alfredo, a Banda passou para os filhos, porém os dois mais novos, José Alfredo e Mário, discordaram da disciplina rigorosa e enérgica dos mais velhos e tradicionalistas, Durval e Josias, o que resultou numa dissidência; os músicos também estavam divididos entre uma nova forma de fazer música e continuar com o mesmo estilo, assim a orquestra Carimã encerra temporariamente suas atividades.

Josias integrava a Euterpe desde os quatro anos de idade, tendo iniciado tocando triângulo. Assumiu a direção já na segunda metade da década de 1920, em virtude da idade avançada do pai.

Por volta de 1938, após retornar de uma temporada residindo no Norte do país, Josias reata a relação com os irmãos, que decidem retornar com a Euterpe Carimã sob sua liderança. Agora chamada de Goiabada, a orquestra voltou a tocar em festas, eventos religiosos e civis, carnavais e até em partidas de futebol.

Ainda àquele ano, a orquestra fora se apresentar na cidade de União, no Piauí. Foi então que seu irmão José Alfredo, ao separar o mais novo, Mário, de uma briga, fora gravemente ferido, o que acabou acarretando em sua morte. Após a tragédia, os músicos decidiram encerrar de vez a nonagenária Euterpe Carimã “Goiabada”. Com o fim da orquestra, Josias se mudou para o Rio de Janeiro, onde deu prosseguimento em sua carreira de músico. Mário e Durval continuaram em Caxias. Um montou o primeiro conjunto de Caxias; o outro ingressou na banda de música Lira Caxiense, recém-fundada. O restante dos músicos integrou outras bandas e orquestras caxienses que estavam em atividade, tais como a própria Lira e a “14 de julho”.

Apenas em 2019, mais precisamente no dia 07 de setembro, após mais de 70 anos em inatividade, é que a Euterpe Carimã volta a ativa. Diferentemente de suas antigas formações, agora a Euterpe conta com a participação mista de homens e mulheres em seu corpo musical. Sob a direção do maestro Neto Carvalho, a banda conta com 30 ritmistas e 16 instrumentistas de sopro, somando 46 integrantes (dados do ano de 2019).

A Euterpe Carimã em fotografia do ano de 2019.

Fontes de pesquisa: Jornal Pacotilha; Jornal de Caxias; Jornal O Imparcial; A Música em Caxias: Um Prolífico Centro Musical no Sertão Maranhense/Autor: Daniel Lemos Cerqueira; Livro Cartografias Invisíveis/Texto de Raimundo Ressureição; Jornal Cruzeiro; Site da Prefeitura de Caxias

Imagens da publicação: Jornal O Imparcial; Ac. do IHGC; Reprodução do YouTube

Restauração e Colorização: Brunno G. Couto

O antigo casarão colonial da Praça Gonçalves Dias

PARTE DO CASARÃO VOLTADA PARA O LARGO DO POÇO (ATUAL PRAÇA GONÇALVES DIAS).
FRANCISCO VILLA NOVA

Construção colonial em pedra, no século XIX este casarão pertencia a Alarico José Vilanova. Posteriormente, foi adquirido pelo coronel Francisco Raimundo Villanova (prefeito de Caxias no período de 1934/1935), onde passou a residir junto a sua família, bem como montou sua casa comercial. No seu entorno, existia um olho d’água do extinto Riacho da Pouca Vergonha.

A extensão do imóvel chamava atenção dos caxienses, sendo composto por doze portas e sete janelas, que se estendiam na esquina do antigo Largo do Poço (atual Praça Gonçalves Dias) e da Rua Afonso Pena.

O CASARÃO EM 1920

Na parte voltada à praça, era a sua casa comercial, e na parte da Rua Afonso Pena, sua residência. A chamada “Casa Vilanova” ostentava em sua fachada o desenho de uma águia ladeada por duas faixas com os dizeres: “Comércio e Lavoura”. Ali, Chico (como era mais conhecido) Vilanova atendeu os seus clientes até avançada idade.

Além do comércio do coronel, também operou por muitos anos em suas dependências a escola de datilografia de sua filha, Jacyra Vilanova. Um dos diferenciais arquitetônicos do casarão era o seu mirante de duas pequenas janelas, exemplar único de Caxias.

PARTE DA FACHADA DO IMÓVEL, ONDE É POSSÍVEL OBSERVAR O DESENHO DA ÁGUIA JUNTO ÀS DUAS FAIXAS. ANO: 1950.
RUA AFONSO PENA; ANO: 1942.
1: RESIDÊNCIA DA FAMÍLIA VILANOVA, BEM COMO ONDE FUNCIONOU A ESCOLA DE DATILOGRAFIA.

2: RESTANTE DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL “CASA VILANOVA”

Na década de 1960, no local da Casa Vilanova passou a funcionar a Farmácia São José. Por volta da década seguinte, o centenário mirante fora demolido; os descendentes da família Vilanova venderam parte dos prédios, que começou a abrigar pequenos comércios – como funciona até os dias de hoje. O imóvel, atualmente, encontra-se bastante descaracterizado, mas ainda mantem alguns elementos originais, como seu beiral.

UMA DAS ÚLTIMAS FOTOGRAFIAS ANTES DA DEMOLIÇÃO DO MIRANTE. ANO: 1976.

Abaixo, um comparativo do imóvel no anos de 1920 e 2012. Para visualizar, arraste a bolinha central para os lados:


Fontes de pesquisa: Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto; Depoimento de Antônio Augusto Ribeiro Brandão; Site de Eziquio Barros Neto

Imagens da Publicação: Ac. de Eziquio Barros Neto; Internet; Álbum do Maranhão de 1950; Revista Athenas; Ac. do IHGC

Restauração: Brunno G. Couto

O antigo sobrado colonial do largo da Matriz

Localizado na esquina da atual Rua Gustavo Colaço com a Travessa Caetano Carvalho, no largo da Igreja Matriz, o antigo sobrado colonial pertencia a Antônio Bernardo da Silveira, e já estava edificado pelo menos desde o ano de 1814. Quem nos conta a história do proprietário é o pesquisador caxiense Eziquio Neto: “Bernardo era advogado, Comandante da Guarda Nacional ligado ao Partido Liberal, conhecido como Bem-Ti-Vi, e, por isso, acabou sendo detido durante a revolta da Balaiada pelo apoio aos rebeldes. Seu irmão, Bernardo Antônio da Silveira, foi acusado de ter enviado comunicação a Raimundo Gomes, líder da revolta, a ocupar Caxias em vingança ao assassinato de Teixeira Mendes, em 1837.”


O sobrado em fotografia do início do século XX.

Anos depois, em 1874, a situação do imóvel já era preocupante, de acordo com relatório da Câmara Municipal: “Pede licença igualmente a esta câmara para vender a sexta parte que possui no sobrado da praça da Matriz, que está em mau estado, o qual sendo ILEGÍVEL por Antônio Bernardo da Silveira, que não tem feito os reparos necessários, terá de ficar completamente arruinado”. Com a morte do proprietário, o casarão passou a seus herdeiros, até que fora adquirido pelo comerciante Clemente das Chagas Cantanhede, juntamente com alguns imóveis que o ladeavam.

Na década de 1940, o imóvel passou a hospedar a “Movelaria Carioca” da firma Plosk & Seloni, de Salomão Plosk e Henrique Seloni, respectivamente. Plosk, experiente comerciante, já havia fundado, no ano de 1935, em São Luis, a matriz de sua movelaria. Visando expandir o seu negócio, junta-se a Henrique (que residia em Caxias) para fundar uma filial na princesa do sertão. A movelaria era especializada em comercializar móveis ricamente trabalhados em madeiras de primeira qualidade.


Fotografia do casarão quando abrigava a Movelaria Carioca, da firma Plosk & Seloni. Imagem da década de 1940.

A empreitada não teve vida longa, tendo o imóvel, em 1944, recebido uma drástica reforma, perdendo o aspecto colonial de seus beirais e ganhando elementos Art Decó. Entre as décadas de 1950 e 1960, foi comprado por Lamek Teixeira Mendes, passando a funcionar, na parte de cima, o Hotel Colinas, de propriedade de sua esposa, Maria Barros. No térreo funcionou a Casa de Modas, de Alderico Silva.

O sobrado após a ampla reforma realizada. Fotografia, provavelmente, da década de 1960.

Infelizmente, o casarão foi demolido por volta da década de 1970, sendo construído, em seu lugar, um espaço que abrigou diversos pontos comerciais.


Local onde situava-se o casarão, em imagem de 2012.

Fontes de pesquisa: Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto; Hemeroteca Digital

Imagens da publicação: Internet; Ac. do IPHAN; Ac. do IHGC; Google Maps

Restauração e Colorização: Brunno G. Couto