A história da Fábrica de Manufatura Caxiense (Atual Centro de Cultura)

Texto de Brunno G. Couto

“Se nós, aqui, não temos uma fábrica de fiação e tecelagem; Caxias, lá no interior, é que vai ter?!”. Ao ouvir, de empresários ludovicenses, essas palavras em tom de chacota, Francisco Dias Carneiro tomou aquela indagação como objetivo de vida. Rumou de volta à Caxias, e fundou, com a ajuda do povo, em 22 de outubro de 1889, a Companhia União Caxiense, que viria a ser proprietária, não de uma, mas três fábricas de fiação e tecelagem na cidade.

Dias Carneiro, aos 40 anos de idade.

Dias Carneiro havia ido a São Luis em busca de apoio empresarial para a sua futura empreitada. Contudo, como vimos, a viagem fora infrutífera. Ao retornar a Caxias, os caxienses, sabedores da luta de Carneiro, abraçaram a ideia e, mesmo com dinheiro insuficiente, levaram a cabo a fundação da sociedade. Primeiramente, em 01/01/1888, fora fundada a Fábrica Industrial Caxiense, a primeira fábrica têxtil do Maranhão. Posteriormente, veio a Fábrica União Caxiense, tendo suas obras iniciadas no final de 1889. Dias Carneiro, homem vitorioso, faleceu no ano de 1896 em Caxias .

“O processo de industrialização no Maranhão ocorreu no final do século XIX, com a instalação de varias unidades fabris especializadas no processamento da fibra de algodão, cuja cultura tem sido apontada como maior responsável pela ampla projeção econômica verificada nos séculos XVIII e XIX. O algodão serviu em grande escala como matéria prima para as fabricas têxteis do Maranhão. Nesse cenário, Caxias, que era uma das cidades mais populosa da província e grande produtora de algodão, chegou a exporta ‘para as praças da Europa, pelo porto de São Luís, ou para os grandes centros do sul, através do Piauí, Pernambuco e Bahia’ (COUTINHO, 2005, P.293), sendo pioneira no ramo têxtil no Estado do Maranhão”.

Em 1892, impulsionado pela febre das fábricas, chegou a vez da mais ambiciosa delas. Estabelecida, em 22/05/1892, a sociedade anônima denominada Companhia Manufatura Caxiense S/A, tinha como principais responsáveis os seus diretores fundadores: Segisnardo Aurélio de Moura, José Ferreira Guimarães (bisavô da atriz Glória Menezes), José Castelo Branco da Cruz e Antônio Bernardo Pinto Sobrinho. O local escolhido para a instalação da vindoura fábrica era distante das fábricas supracitadas, que localizavam-se no Ponte. A preferência foi por um terreno próximo a Estação Férrea Caxias – Cajazeiras , que vinha sendo construída, além da proximidade ao rio Itapecuru e seus portos muito movimentados.

Como o terreno escolhido era alagadiço, houve uma demora até que fosse realizada a drenagem do solo, sendo lançada a sua pedra fundamental no início de 1893. A nova fábrica teve o capital inicial 850 contos de réis, de 260 acionistas, que subscreveram 2.834 ações; sem qualquer incentivo do Estado. O projeto arquitetônico ficou a cargo do engenheiro Palmério Cantanhede, que, em virtude do acompanhamento das obras, residiu em Caxias por 18 meses. As estruturas metálicas foram importadas dos Estados Unidos e da Inglaterra, sendo transportadas pelo mar até São Luis, e, de lá, pelo rio Itapecuru até Caxias. As telhas vieram da França.

Detalhe da parte interna do teto da fabrica. Ano da imagem: 2020.
Detalhe interno da chaminé. Ano da imagem: 2020.

Um ano depois, o prédio estava quase concluído, estando todo coberto; a chaminé, de 38 metros de altura, estava finalizada e as caldeiras instaladas. Não obstante, ainda levara alguns anos para a sua finalização. Até que, em 18/09/1898, a fábrica é, enfim, inaugurada. Recebendo o nome de “Fábrica Gonçalves Dias”. A cerimônia de inauguração teve início às 10h, contando com uma grande número de presentes. Realizando a benção do novo prédio, estava o o vigário da Igreja de São Benedito, José Ewerton Tavares. Serviam de paraninfos os senhores: Comendador Francisco de Britto Pereira; Capitão Lionídio Britto Lima dos Reis; Joaquim Barbosa Caldas e Joaquim José Pinto de Moura.

A Fábrica em fotografia de 1908.

Após um longo e belo discurso do padre, o Tenente-Coronel Manoel Gonçalves Pedreira (pai do médico Miron Pedreira), na qualidade de chefe do poder executivo municipal, surgiu no local em que via-se uma fita de cor verde prendendo o volante do motor. Após improvisar um discurso – onde lembrou os serviços prestados por Dias Carneiro (já falecido), Custódio Santos e José Ferreira Guimarães à economia de Caxias – muniu-se de uma tesoura (oferecida pelo coronel José Castelo da Cruz) e cortou a faixa, declarando inaugurada a nova fábrica de manufatura de Caxias, a Fábrica Gonçalves Dias.

Assim que a fita simbólica fora cortada, imediatamente todos os mecanismos entraram em funcionamento, para a admiração dos presentes. Concomitantemente, é executado, pela banda do maestro Carimã Junior, o hino nacional. Após as solenidades programadas, os visitantes puderem visitar as instalações da fábrica. A visão deles foi a seguinte:

Ao lado da porta principal do escritório, viam-se duas árvores de algodão, contendo uma as maçãs e outras os capulhos da preciosa fibra. Mais adiante, ao adentrarem um dos compartimentos da fábrica, viram: algodão em caroço e em pluma; rolos já empastados, fios em maçarocas e carretéis. 

Além disso, morins de diferentes marcas e larguras, em fardos de dez peças; cretones, mesclinas, brins de várias cores; e toalhas, que ocupavam todo o espaço do vasto compartimento. Nos lados superiores das paredes, pendiam cortinas encimadas por escudos com as cores nacionais, nos quais liam-se os nomes dos diversos municípios do Maranhão. 

Toda essa ornamentação fora produzida pelo maquinário da própria fábrica, que fora importado da casa comercial Sons & Co., de Henry Rogers, localizada na cidade de Wolverhampton, na Inglaterra. 
Parte interna da torre.

O industrial Zezinho Guimarães.

Passando por dificuldades financeiras, a Fábrica Gonçalves Dias teve vida curta, fechando as portas em 1901, três anos após a sua inauguração. Sendo vendida, em 1902, em um leilão judicial por 40 contos de réis para o Banco da República, o credor hipotecário. No ano seguinte, a Companhia União Caxiense, proprietária da Fábrica União e da Fábrica Industrial, assume o seu controle até o ano de 1919, quando dois comerciantes teresinenses arrendaram-na. Em 1923, a fábrica a Companhia União Caxiense assume novamente o seu controle, sendo o comerciante Zezinho Guimarães (filho de José Ferreira Guimarães) o seu maior acionista. O industrial controla a Manufatura até 1944, quando transfere-a a um grupo paulista sob a liderança de José de Agustinis. Até que, em 1958, a Fábrica de Manufatura encerra, de vez, as suas atividades.

A fábrica em pleno funcionamento, por volta do ano de 1920.

Desde o seu encerramento, o prédio da fábrica permaneceu sem utilização. Correndo o risco de ser desmontado, o prédio estava em completo abandono quando, em 1977, o prefeito Aluízio Lobo incorpora o imóvel ao município; sendo, em 1980, revitalizada as suas dependências para abrigar o Centro de Cultura Acadêmico José Sarney.

Década de 1970. Após anos desativado, o prédio começa a passar por reformas para abrigar o vindouro Centro de Cultura.


Nesse mesmo ano, é realizado o tombamento do prédio pelo Estado, conforme o Decreto Estadual n. 7.660, de 30 de agosto. Desde então, o prédio já abrigou teatro, biblioteca, museu, exposições, artesanato, arquivo municipal e lojas. Além disso, vem recebendo diversos órgãos públicos, agências bancárias, e, até mesmo – de forma provisória – escolas.

Um dos mais icônicos símbolos de Caxias, em 08 de setembro de 2021 o prédio, de estilo neoclássico, completou 123 anos de história.

O prédio em fotografia recente.

Abaixo, um comparativo da fábrica no anos de 1920 e 2012. Para visualizar, arraste a bolinha central para os lados:


Fontes de pesquisa: Jornal de Caxias; Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto; Artigo “A participação das Mulheres no Espaço Têxtil e sua Contribuição nos Aspectos Econômicos de Caxias – MA”/Autoras: Ana Carolina de Azevedo e Raquel dos Santos Lima

Imagens da publicação: Ac. de Eziquio Neto; Youtube; Ac. de David Sousa; Álbum do Maranhão de 1908; internet; Site da prefeitura de Caxias; Google Maps

Colorização e Restauração: Brunno G. Couto

A História do Calçadão (Rua Afonso Cunha)

Com sua história remontando, provavelmente, ao século XVIII, esta rua foi inicialmente nomeada de Rua Augusta. É durante o século XIX, quando o comércio migra da região portuária da Rua do Porto Grande (atual Anísio Chaves) e vem para o centro, que a então Rua Augusta passa a ser uma estratégica e importante via comercial; onde, objetivando atender a uma clientela mais exigente e abonada, ali instalaram-se diversas lojas que comercializavam produtos vindos da Europa.

Ligando os largos da Matriz e do Poço (atual praça Gonçalves Dias), a rua supracitada sempre foi muito movimentada, não só por transeuntes, como também por inúmeros animais de carga. Apesar de legalmente previsto anos antes, é apenas por volta de 1866 que a via recebe a iluminação de alguns lampiões a óleo.


A então Rua Dias Carneiro em fotografia de 1920. Ao fundo, o largo da Matriz.

Em 1896, com o falecimento do industrial Francisco Dias Carneiro, a Câmara de Caxias alterou, em sua homenagem, o nome da via para Rua Dias Carneiro. Nome, esse, que permaneceu por mais de 50 anos, mais precisamente até o ano de 1948, quando o então prefeito da cidade, Eugênio Barros, alterou o seu nome para Afonso Cunha, em homenagem a este ilustre caxiense falecido no ano anterior.


Rua Afonso Cunha em fotografia de 1950. Ao fundo, a praça Gonçalves Dias.

Essa rua, até o início do século XX, não possuía calçamento. Até que, entre 1900 e 1910, recebeu calçamento em pedra bruta. No início da década de 1930, durante a administração do prefeito Alcindo Guimarães, as pedras foram substituídas por paralelepípedos que perduraram até 1937.

Na década de 1960, na esquina que faz ligação com a Rua Coelho Neto, é que começam a se instalar barracas de frutas, sendo essa mudança bastante criticada. Dentre tantas, uma das reclamações afirmava que, em pouco tempo, a via iria se tornar um mercado a céu aberto, vendendo, inclusive, animais abatidos. Apesar da insatisfação popular, nada foi feito. Com o passar dos anos, cada vez mais e mais barracas foram se instalando no meio da via; passando, assim, a competir e dividir espaço com os lojistas e residências que a circundavam.


A via vista a partir da esquina com a Rua Coelho Neto; local onde, nessa época, começaram a instalar-se as primeiras barracas de frutas. Fotografia da década de 1960.

Com o aumento constante do número de barracas, o trânsito de veículos e pedestres começou a dificultar-se. Transformar a rua exclusiva para o comércio passou a ser um sonho dos lojistas. Até que, em 1989, o prefeito Sebastião Lopes atendeu os pedidos e fechou a rua. Em agosto daquele ano iniciaram-se as obras de drenagem da via, a pavimentação em pedras portuguesas, bem como a instalação de bancos e paisagismo. Após a ampla reforma, a Rua Afonso Cunha passa a ser conhecida popularmente como Calçadão.


Bancos instalados após a grande reforma da rua. Imagem do ano de 1995.

Mesmo após a reforma, muitas barracas voltaram a se instalar na rua. Além disso, os lojistas do ramo de tecidos colocavam os seus produtos expostos no meio da via. Dificultando mais uma vez o trânsito da população. E assim, no fim da década de 1990, a Administração Pública percebeu que os jardins e os bancos, unidos ao aumento dos camelôs, mais atrapalhavam que ajudavam. Dessa forma, foi providenciada a demolição de suas estruturas, o que, consequentemente, aumentou o número de ambulantes.


Lojistas colocavam os seus produtos em exposição no meio da via. Imagem de 1995.

Até a produção desta matéria, estão em curso as obras do shopping popular na Avenida Otávio Passos; onde, segundo o Poder Público, serão realocados os ambulantes da Rua Afonso Cunha. Descongestionando, dessa forma, o histórico logradouro.


Fonte de pesquisa: Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto

Imagens da Publicação: Internet; Álbum do Maranhão de 1950; Acervo de Aluízio Lobo; Reprodução TV Paraíso.

Restauração e Colorização: Brunno G. Couto

1929, o ano em que a luz elétrica chegou à Caxias

Destaque do Jornal O Imparcial, de 11 de março de 1929.

Em 28/07/1929, através da firma Araújo Carvalho & Cia – cujo o principal sócio era o empresário caxiense Nachor Carvalho -, foi solenemente fincado o primeiro poste de luz elétrica de Caxias. Alguns meses antes, a Prefeitura havia assinado, com a referida firma, o contrato de instalação do serviço de luz elétrica no município que, até então, era iluminado por lampiões.

A Usina responsável pela empreitada chamava-se “Dias Carneiro”, e estava instalada à Rua Aarão Reis, no imóvel onde, anteriormente, havia funcionado a sede do jornal O Zephyro. De início, a Usina fornecia energia elétrica para 580 consumidores e para a iluminação pública na zona central da cidade. Anos depois, as suas instalações foram transferidas para o bairro Cangalheiro, e na administração do prefeito João Machado (1956/1961), foi adquirida pela Municipalidade.

Registro da solenidade de instalação do primeiro poste de luz elétrica de Caxias, em 28 de julho de 1929. Ao fundo, observa-se o edifício da Usina, à Rua Aarão Reis.

Segundo relatos, entre as décadas de 1950 e 1960, a energia fornecida pela usina era ligada às 6h e desligada às 22h, de segunda a sexta. Aos sábados, ficava ligada até às 2h da madrugada, devido às festas que eram realizadas pela cidade. A interrupção era necessária para que as caldeiras da usina pudessem descansar para poderem entrar em atividade no dia seguinte.

A Usina Dias Carneiro funcionou até a década de 1960, quando encerrou suas operações. O imóvel da Aarão Reis fora demolido e, em seu lugar, o industrial Armando Vieira Chaves ergueu sua residência (onde atualmente está instalada a Receita Federal).


Fontes de pesquisa: Jornal O Imparcial; Livro Efemérides Caxienses/Autor: Arthur Almada Lima Filho; Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto; Livro Cartografias Invisíveis/Diversos Autores.

Imagens: Jornal O Imparcial.