A história da Euterpe Carimã, a primeira banda marcial de Caxias

Antônio Marcellino Rodrigues Carimã Junior

Não se sabe ao certo o nome do fundador da Euterpe caxiense. Consta, entretanto, tratar-se de um padre. Por outra lado, há documentação exata da data de início de sua vida social: 16 de novembro de 1848, uma quinta-feira. Os seus componentes iniciais eram a seleção dos melhores músicos da cidade, alguns pertencentes a alta sociedade local. Motivos diversos, porém, levaram-na a pleno declínio em começos de 1870.

Nesse período, chega à Caxias o hábil alfaiate e apreciado musicista ludovicense Antônio Marcellino Rodrigues Carimã Junior. Rapaz novo e orgulhoso proprietário de um Stradivarious, que tomou para si o encargo de reorganizar a “Euterpe”. Para tamanha empreitada, juntou-se ao clarinetista Antônio de Sousa Coutinho, que fora seu mestre e com quem repartiu os louros e os dissabores da empresa. Com essa restruturação, a Euterpe passou a se chamar “Euterpe Carimã”, em homenagem ao seu comandante .

Curiosidade: O aclamado maestro caxiense Elpídio Pereira recebeu as primeiras lições de música nas salas de ensaio da Euterpe Carimã.
Antônio Carimã, afilhado.

Primeiramente, a Euterpe era somente uma banda de músicas marciais, apenas na virada do século é que a Orquestra é posta em ação. Em 19/04/1907, morreu Antônio Carimã Junior; o músico – que também era agente dos Correios de Caxias – contava com mais de 60 anos de idade e era solteiro. Com a morte do amigo, Coutinho passou o comando da Euterpe a Antônio Carimã, afilhado, que não desmereceu a confiança. A sua gestão, porém, foi curta, haja vista o seu falecimento em 09/07/1913.

Sem direção, os músicos decidiram passar a chefia a uma tradicional família caxiense de músicos, representada nas pessoas do trombonista Alfredo Beleza e de seu irmão Mário Pinho, soprano.

Em 1928, a Euterpe Carimã comemorou o seu 81 aniversário, sendo realizada uma grande festa nas dependências do Teatro Fênix. Esse período foi o auge da orquestra, onde realizou apresentações por diversas cidades do Maranhão e Piauí. O seu repertório era vastíssimo, sendo composto de trechos clássicos às últimas novidades musicais, bem como composições locais. Em sua primeira excursão a São Luis, em julho de 1929, a Euterpe apresentou-se em praça pública e no Teatro Arthur Azevedo.

Após a aclamada apresentação no Teatro Arthur Azevedo, no dia 29/07/1929, o povo entusiasmado acompanhou a Euterpe Carimã até o quartel da Força Policial, erguendo vivas a Caxias e a seus músicos.
Fotografia da Euterpe Carimã, no ano de 1928.

Nesse período a Euterpe era composta por 24 músicos (imagem abaixo) divididos nos seguintes instrumentos: violino A e B; saxofone, alto bemol e soprano; clarinete, piston, trombone, contrabaixo de metal, bateria, xilofone, pandeiro, flauta e flautim.

*Devido a um erro de digitação, o nome de um dos músicos acabou saindo errado. A grafia correta é “Canário”.


Em 1936, a Euterpe Carimã sofre uma grande perda. Na ocasião, os músicos estavam a bordo da lancha “Itamar” que partia de Colinas à Caxias. Por alguma razão desconhecida, a embarcação envolveu-se em um acidente. O desastre acabou tirando a vida do músico Benedito dos Santos, vulgo Camburão, que morreu afogado.

Em 1937, com o falecimento do Mestre Alfredo, a Banda passou para os filhos, porém os dois mais novos, José Alfredo e Mário, discordaram da disciplina rigorosa e enérgica dos mais velhos e tradicionalistas, Durval e Josias, o que resultou numa dissidência; os músicos também estavam divididos entre uma nova forma de fazer música e continuar com o mesmo estilo, assim a orquestra Carimã encerra temporariamente suas atividades.

Josias integrava a Euterpe desde os quatro anos de idade, tendo iniciado tocando triângulo. Assumiu a direção já na segunda metade da década de 1920, em virtude da idade avançada do pai.

Por volta de 1938, após retornar de uma temporada residindo no Norte do país, Josias reata a relação com os irmãos, que decidem retornar com a Euterpe Carimã sob sua liderança. Agora chamada de Goiabada, a orquestra voltou a tocar em festas, eventos religiosos e civis, carnavais e até em partidas de futebol.

Ainda àquele ano, a orquestra fora se apresentar na cidade de União, no Piauí. Foi então que seu irmão José Alfredo, ao separar o mais novo, Mário, de uma briga, fora gravemente ferido, o que acabou acarretando em sua morte. Após a tragédia, os músicos decidiram encerrar de vez a nonagenária Euterpe Carimã “Goiabada”. Com o fim da orquestra, Josias se mudou para o Rio de Janeiro, onde deu prosseguimento em sua carreira de músico. Mário e Durval continuaram em Caxias. Um montou o primeiro conjunto de Caxias; o outro ingressou na banda de música Lira Caxiense, recém-fundada. O restante dos músicos integrou outras bandas e orquestras caxienses que estavam em atividade, tais como a própria Lira e a “14 de julho”.

Apenas em 2019, mais precisamente no dia 07 de setembro, após mais de 70 anos em inatividade, é que a Euterpe Carimã volta a ativa. Diferentemente de suas antigas formações, agora a Euterpe conta com a participação mista de homens e mulheres em seu corpo musical. Sob a direção do maestro Neto Carvalho, a banda conta com 30 ritmistas e 16 instrumentistas de sopro, somando 46 integrantes (dados do ano de 2019).

A Euterpe Carimã em fotografia do ano de 2019.

Fontes de pesquisa: Jornal Pacotilha; Jornal de Caxias; Jornal O Imparcial; A Música em Caxias: Um Prolífico Centro Musical no Sertão Maranhense/Autor: Daniel Lemos Cerqueira; Livro Cartografias Invisíveis/Texto de Raimundo Ressureição; Jornal Cruzeiro; Site da Prefeitura de Caxias

Imagens da publicação: Jornal O Imparcial; Ac. do IHGC; Reprodução do YouTube

Restauração e Colorização: Brunno G. Couto

José Compasso da Silva (Zé Pretinho)

José Compasso, quando goleiro da Seleção Caxiense, em 1947.

José Compasso da Silva nasceu em Caxias, à Rua do Piquizeiro (Atual, Rua Nossa Senhora de Fátima), no dia 31/10/1926. Filho do estivador Lino Silva e da lavadeira Paulina Compasso da Silva, tinha mais quatro irmãos: Raimundo, Antônio, João e Cândida Compasso da Silva. Junto à família residia ao lado do imóvel do ‘seu’ Seringueiro, pai de João Braz (proprietário do restaurante Selva do Braz). Fora nessa residência que passara sua infância, vindo a receber o apelido de “Zé Pretinho”.

Zé Pretinho nunca gostou muito de estudar, sendo recorrentes as suas fugas da escola para ir jogar bola com os amigos. Diante dessa recorrente situação, d. Paulina decide colocar o filho para trabalhar como aprendiz de sapateiro. Mas não adiantou muito, já que, aos 12 anos de idade, surge outra paixão na vida do pequeno Zé, a música. Dedicado, em pouco tempo o menino já tocava violão, banjo, cavaquinho e bateria. Contudo, por se identificar mais com a percussão, a bateria fora o instrumento em que mais se aprofundou.

Como nessa época a vida musical não era bem vista, o irmão mais velho de Zé o leva a aprender o ofício de pedreiro. Não obstante exercer uma profissão “oficial” que pagava as contas de casa, Zé Pretinho nunca deixou o futebol e a música de lado. Concomitantemente, passa a fazer parte dos times locais. Devido à altura, a sua função não poderia ser outra: goleiro. Em 1947, aos 21 anos de idade, já integrava a Seleção Caxiense, que, àquele ano, sagrou-se campeã de um torneio regional.

Nessa época, Zé Pretinho casa-se com sua primeira esposa, d. Neuza Muniz de Sousa. O casal teve três filhos, Neuzelina, Lino e Maria de Fátima Compasso da Silva. No final da década de 1950, com a construção de Brasília, Zé Pretinho decide, assim como muitos caxienses, ir trabalhar nas obras da nova capital da República. De volta à Caxias, ainda participou de muitas outras equipes futebolísticas, como: Guará, Palmeiras (seu time do coração), Maranhão, Atlético Clube; e teve participação no River, do Piauí. Chegou, inclusive, a receber um convite para atuar profissionalmente no Rio de Janeiro. Contudo, vendo o sofrimento da mãe com a sua partida (era o filho caçula), retorna à sua cidade natal.

Quando goleiro do Guará, na década de 1960.

Casou-se novamente. Do segundo matrimônio, com d. Iracy de Jesus Compasso da Silva, advieram: Iracilina, José Manoel, Francisca Tereza, Iris Maria, Francisca Maria, Irismar Maria, Paulo Jorge, Iris Mary, Marcos Roberto, Paulina Renata, Iracy de Jesus, Mardemys Jonnys, Márcio e Iris. A família residia à Rua Beco do Galo, 426. Para sustentar a extensa descendência, Zé Pretinho, além de pedreiro, desenvolvia outras atividades, como: eletricista, marceneiro, pintor e desenhista arquiteto (apesar de não ter formação na área, desenhava as plantas de casas e prédios que por ele eram construídos).

Na década de 1960, passa a, concomitantemente, atuar profissionalmente no meio musical; integrando a Orquestra Santa Cecília, de Josino Frazão, e o conjunto de Mário Beleza. Em Mário Beleza e Seu Conjunto, a formação era: Zé Pretinho (bateria), Paulo (trompete), Seu Chagas (trombone), Magalhães (contrabaixo), Olavo (violão elétrico), Mister Dame (acordeom; substituído posteriormente por Haroldo), Zé Mamão (vocal) e Rachel (vocal). Durante o seu período de atividade, o conjunto foi um sucesso, sendo presença constantes nos bailes caxienses. Era como cantava Jorge Ben Jor nos primeiros versos de sua famosa música: A banda do Zé pretinho chegou / Para animar a festa…

Zé Pretinho tocando bateria no conjunto de Mário Beleza, na década de 1960.

Com o fim do conjunto musical e já com idade avançada para o futebol, Zé Pretinho passou a se dedicar à construção civil. Por trabalhar muito na zona rural, na edificação de escolas, acabou sendo picado pelo mosquito barbeiro, vindo a sofrer de “coração grande”. Já acometido com esse problema, sofre um AVC, o que leva ao seu falecimento no dia 01/05/1994, Dia do Trabalho, aos 68 anos de idade. Àquele mesmo dia, o Brasil despedia-se de Ayrton Senna, e Caxias de José Compasso da Silva, o Zé Pretinho.

Deixou 13 netos e 11 bisnetos. Dentre eles, Fábio Bruno Compasso Brito, que herdou a paixão do avô pelo futebol, e hoje corre atrás do sonho de ser um grande jogador. Aos vinte anos de idade, desde os onze, quando começou no esporte, Fábio acumula um extenso currículo de atuação em times de diferentes estados do Brasil, bem como uma passagem pela Itália. Atualmente, joga pelo Juventude Samas, do Maranhão.


Fontes de pesquisa: Depoimento de Irismar Compasso da Silva (filha de José Compasso); Livro Cartografias Invisíveis/Diversos Autores

Imagens da publicação: Revista Esporte Ilustrado (RJ); Acervo do IHGC

Colorização e Restauração: Brunno G. Couto