Quando Coelho Netto foi parar nos quadrinhos


Na década de 1950, baseado nas revistas americanas “Classics Illustrated” e “Classic Comics”, a editora brasileira EBAL começou a editar mensalmente o título “Edição Maravilhosa”, visando publicar adaptações para os quadrinhos dos grandes clássicos da literatura universal.

Nas primeiras 23 edições, a EBAL publicou histórias importadas. Já na edição 24, o jornalista Adolfo Aizen, fundador da editora, encomendou ao haitiano André LeBlanc, que adaptasse o livro “O Guarani” de José de Alencar. A iniciativa mostrou-se um sucesso. Dessa forma, após escalar uma grande equipe de renomados artistas para a publicação, passou a focar na quadrinização de obras da literatura brasileira.

E assim, em agosto de 1957, na edição n°154, foi a vez do caxiense Coelho Netto ser adaptado para uma nova mídia. Para tanto, fora escolhido o seu famoso romance “A Conquista”. Com desenhos do aclamado ilustrador Nico Rosso, a obra – de pouco mais de 50 p. -, completou, em 2023, 66 anos.

Para quem quiser ler o quadrinho, é só clicar aqui para fazer o download.

Sálvio Negreiros, o caxiense que foi um dos maiores ilustradores do Brasil

Salvio Correia Lima Negreiros nasceu em Caxias, em 31/08/1924, filho de Alice Correia Lima e Joaquim Negreiros. Tinha mais quatro irmãos: Áurea, Muriel, Júlio e Alberto. O seu pai era um conhecido comerciante de Caxias, sendo proprietário da popular “Casa J. Negreiros” , que localizava-se à Rua Aarão Reis, no centro da cidade.

Desde a infância, o desenho sempre fora a grande paixão do pequeno Sálvio. Começou rabiscando as calçadas com pedaços de carvão, com os diversos desenhos que lhe vinham à cabeça: cavalos, casas, bonecos, aviões etc. As pessoas que passavam por ele diziam: “Coitado! Esse, quando crescer não dará para nada…”. Quando as calçadas já não eram suficientes, acabou enchendo os cadernos da escola com mais e mais desenhos; firmando, pouco a pouco, o seu talento.

Em 1934, surge no Brasil, de propriedade de Adolfo Aizen, a revista Suplemento Juvenil, que foi a primeira publicação brasileira dedicada a quadrinhos de heróis e com personagens famosos das tiras de jornal norte-americanas, como Mandrake – O Mágico, Flash Gordon, Tarzan, além dos desenhos Disney, como Pato Donald e vários outros que fizeram parte da “Era de Ouro dos Quadrinhos”

Em Caxias, um exemplar da Suplemento Juvenil chega às mãos de Sálvio, e logo passa a ser o centro das atenções do jovem. Certo dia, ao folhear a revista, Sálvio deparou-se com um anúncio de um concurso de desenho. Tratava-se de fazer uma história em quadrinhos que tivesse como motivo a “Retirada da Laguna”, o feito histórico do General Camisão. O prêmio: 500.000, 00 réis. Entusiasmado, começou a esboçar o desenho, a idealizar os quadrinhos e a dar forma às figuras. Em pouco tempo estava pronto o trabalho; enviado, logo em seguida, para à redação do Suplemento Juvenil, no Rio de Janeiro.

Algum tempo depois, qual não fora a surpresa? Sálvio – então, com 16 anos de idade – ficara em primeiro lugar no concurso, entre os 25 inscritos, sendo a sua história publicada na edição do Suplemento Juvenil de 12 de junho de 1941. Em Caxias, ao receber a edição da revista, Sálvio não conseguia acreditar no que estava lendo.

Para achar mais incentivo artístico, Sálvio transferiu-se para São Luis. E lá, em 1942, tomou parte no Salão de Pintura com um quadro a óleo, tendo obtido o 2º lugar, ganhando uma medalha de prata.  A sua maior façanha, porém, teve início em 1943, quando Sálvio tinha apenas 19 anos. O episódio ocorreu quando de sua busca ao prêmio da Suplemento Juvenil no Rio de Janeiro, capital da República, à época. Acontece que, a sua viagem foi das mais acidentadas e cheia de episódios pitorescos. O itinerário foi o seguinte: saindo de São luis passou por Teresina, Fortaleza, Crato, Petrolina, Juazeiro, Pirapora, Belo Horizonte e daí para o Rio. Toda essa caminhada foi feita por trem, cavalo, jangadas, carro de boi, caminhão, “gaiola”; enfim, todos os meios de transportes possíveis. E o mais impressionante: tudo isso em 75 dias!

Mas todo esse esforço fora recompensado. Ao constatarem o talento e o esforço do jovem, os dirigentes do Suplemento Juvenil prometeram-lhe, além da premiação em dinheiro, um lugar no Departamento Artístico, tal como haviam feito com as outras pratas da casa, como Fernando Dias da Silva, Celso Barroso e Antônio Eusébio; todos, como Sálvio, vencedores de concursos idênticos.

E assim fora feito. Sálvio, após mudar-se para São Paulo (onde a editora tinha o seu estúdio), desenhou histórias de aventuras para a revista, durante vários anos. Além do trabalho com quadrinhos, Sálvio, através do “Studio Artenova” – da editora carioca de mesmo nome fundada em 1962 -, ficou muito conhecido por suas ilustrações para capas de obras literárias, bem como para o mercado publicitário (Nesse estúdio, Sálvio também era responsável pela direção de arte).

Amigo de Ziraldo, fez parte da primeira geração de quadrinistas brasileiros. “Convém informar aos leitores que eu conheci Fernando, Sálvio e Celso, junto com Monteiro Filho – que são os quatro maiores ilustradores que já apareceram depois na publicidade brasileira”, disse, em 1972, o criador do Menino Maluquinho.

Em 1971, Sálvio volta a residir, junto à sua família, no Rio de Janeiro. Cidade na qual veio a falecer, em 1991, vitimado por um câncer de próstata. O caxiense deixou esposa, filhos e três netos. Um de seus filhos, Carlos Negreiros – que, gentilmente, contribuiu para esta postagem -, seguiu passos semelhantes aos do pai, atuando profissionalmente com Diretor de Arte.


Fontes: Genealogia da Família Correia Lima; Suplemento Juvenil (Diversos Números); Blog Tiras Memory; Wikipédia; Informações cedidas por Carlos Negreiros