Rua Benedito Leite, uma via histórica

Rua Benedito Leite em 1920.

Assim como algumas outras ruas de Caxias, a R. Benedito Leite (atual Fause Simão) surgiu de uma estrada de terra da cidade para a zona rural. Partindo do Largo do Poço (atual Praça Gonçalves Dias), seguia em traçado ortogonal e regular, subindo parte do Morro da Pedreira (atual R. Santa Maria) em direção às matas onde localizavam-se as terras dos portugueses.

Por ser uma via planejada, fora nomeada, primeiramente, como Rua Direita. Em 1893, fora renomeada para Rua Formosa, em virtude das belas damas residentes naquele logradouro. Cinco anos depois, em 1898, após a visita do chefe do Partido Republicano e Senador Benedito Pereira Leite à Caxias, fora aprovada pela Câmara dos Vereadores a mudança de nome da antiga Rua Formosa; onde esta passou a ser oficialmente registrada como Rua Benedito Leite – já que fora uma das principais vias em que o referido político passou em sua visita.

Apesar de seu nome oficial, durante décadas àquela via ficou mais conhecida como Rua do Cisco. Atribui-se o nome popular ao acúmulo de lixo que localizava-se em algum trecho da via, e que vinha a ser queimado a céu aberto, restando apenas os ciscos. O mais antigo morador que se tem notícia, é também o mais ilustre: Antônio Gonçalves Dias. Por volta de 1820, o poeta ali residiu com seus pais em um pomposo sobrado (demolido). Fora também nessa rua que, em 1886, fora realizado o primeiro culto evangélico de Caxias. Muitos colégios e redações de jornais também operaram nesse logradouro.

A fotografia mais antiga que se tem notícia é esta abaixo datada de 1920. Nela é possível observar o antigo pavimento, popularmente conhecido como “cabeça de nego”; era uma das poucas vias com calçamento na cidade. O sobrado do lado direito era pertencente à família de Gonçalves Dias. Do lado esquerdo, um exemplo de casa “térrea de mirante” (demolido), um dos raros tipos de arquitetura portuguesa registrados em Caxias.


Arraste a bolinha central para visualizar como está a rua atualmente, 101 anos depois:

1920 e 2021.

Além do poeta, muitos outros caxienses ilustres residiram nessa rua, tais como: Josino Frazão, Victor Gonçalves Neto, Turíbio Oliveira, Antônio Brandão, Enéas Patrício da Silva, José Simão, Enoch Torres da Rocha etc. Em 2009, esse histórico logradouro teve seu nome alterado para R. Vereador Fause Simão, em homenagem ao político (falecido em 2008) que ali tinha residência. Mesmo com a mudança, muitos caxienses ainda a conhecem por seu antigo nome, Benedito Leite.


Fonte de pesquisa: Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto.

Imagens da publicação: Acervo de Eziquio Barros Neto; Acervo do Autor

Restauração e Colorização: Brunno G. Couto

A triste história da mãe e de uma das irmãs de Gonçalves Dias

Antônio Gonçalves Dias, o maior poeta caxiense, faleceu no dia 03/11/1864, no naufrágio do navio Ville Bologna. À época, sua mãe, d. Vicência Mendes Ferreira, não morava com o poeta, e sim com os filhos que tivera com outro esposo, eram eles: Maria Magdalena da Silva (a mais velha), Carlota, Raimunda e Sebastião Correia de Araújo; residindo no antigo Beco das Violas (Também conhecido como Rua das Tabocas. Atualmente chama-se: Rua Teófilo Dias), em Caxias. A situação da família não era nada fácil, necessitando do mínimo para subsistência.

De acordo com o historiador Arthur Almada Lima Filho, em seu livro “Efemérides Caxienses”, d. Vicência, mulher mestiça de origem indígena, foi concubina e funcionária do pai de Gonçalves Dias, o português João Manuel Gonçalves Dias (negociante abastado). Com os pais biológicos, residindo em um sobrado à Rua do Cisco (Atual Fause Simão), Gonçalves Dias passou os primeiros anos de sua infância. No endereço também funcionava a casa comercial do patriarca.


Sobrado da Rua do Cisco (Atual Rua Fause Simão; mais conhecida como Benedito Leite). Demolido na década de 1970. Imagem da década de 1950.

Em 1829, logo que se casou legalmente com d. Adelaide Ramos D’Almeida, pertencente a uma ilustre família de São Luis, o patriarca fez questão de trazer o pequeno Gonçalves Dias (que tinha por volta de seis anos de idade), para a sua companhia e da madrasta. Manuel e Adelaide tiveram mais quatro filhos: João Manoel, José Gonçalves, Domingos Gonçalves e Joana Gonçalves Dias (mãe do advogado e poeta Teófilo Dias).

O casal continuou a morar no imóvel à Rua do Cisco, enquanto D. Vicência teve que procurar uma nova residência (é quando passa a morar na atual Rua Teófilo Dias). Informações de pesquisadores dão conta de que ‘seu’ Manuel proibiu o filho de visitar a sua verdadeira mãe, a qual reencontraria somente quinze anos depois. Após o falecimento do pai, em 1837, o jovem passou a ser criado por d. Adelaide Dias (falecida em 02/03/1877, em Caxias).


Residência de d. Vicência à Rua das Tabocas (Atual Teófilo Dias). Após o falecimento da matriarca, a filha, Maria Magdalena, continuou residindo nessa casa. Anos depois, o imóvel fora demolido. Imagem: Registro feito pelo IPHAN, provavelmente, da década de 1940.

Desde a morte de Gonçalves Dias, autoridades, sabendo das condições de d. Vicência, passaram a enviar mesadas para ajudar em suas despesas; o cidadão Antônio Henriques Leal fora um desses benfeitores. Vale lembrar que, no dia 24/03/1866, pouco mais de dois anos após a morte do filho, d. Vicência, herdeira de Gonçalves Dias – talvez por falta de instrução ou por pressão exterior -, cedeu, “de forma gratuita, plena e inteira”, os direitos de propriedade das obras inéditas e impressas do poeta à viúva do filho, Olympia Gonçalves Dias.

Olympia Gonçalves Dias.

Segundo o IMS: “Olympia, filha do doutor Cláudio Luis da Costa, fundador do Instituto Benjamin Constant, no Rio de Janeiro, casou-se com Gonçalves Dias em 1852, quando o poeta amargava a recusa de seu pedido de casamento feito à mãe da jovem Ana Amélia Ferreira do Vale, por quem nutriu uma grande paixão. A união de Olympia e Gonçalves Dias durou quatro anos infelizes, e dele nasceu uma filha, Joana, que morreu antes de completar dois anos”.

A mãe biológica do poeta faleceu aos 81 anos, em 1879; sendo, no dia 15 de novembro, sepultada no cemitério de N. S. dos Remédios, em uma cerimônia que reuniu diversas autoridades e populares caxienses. Nos últimos anos de sua vida, a matriarca passou a viver de uma pensão concedida pelo Dr. Augusto Olympio Gomes de Castro, autoridade que também financiou o seu funeral.

Após a morte da mãe, Maria Magdalena da Silva, uma das irmãs de Gonçalves Dias pelo lado materno, continuou residindo no imóvel da família: uma casa simples de meia morada, com duas janelas em direção à rua (imagem acima). Em 1884, ao fazer uma visita à Caxias para a instalação da rede telegráfica, o engenheiro Guilherme Schüch (o Barão de Capanema) desejou conhecer a família do renomado poeta caxiense. Ao se dirigir a Rua das Tabocas, ficou espantado com a crítica situação financeira em que vivia a irmã de uma importante figura nacional. Na ocasião, deixou com Maria uma significativa ajuda financeira.

Comunicado, publicado no jornal Diário do Maranhão, em 1886, informando sobre o montante arrecadado em favor de Maria Magdalena.

Nesse mesmo período, a situação de penúria vivida por Maria estampou as páginas do jornal Echo Liberal, de Caxias. Tão logo a notícia fora espalhada, alguns cidadãos da capital do estado tomaram ciência da situação. Assim, determinados cavalheiros promoveram uma subscrição em favor da irmã de Gonçalves Dias, obtendo uma quantia perto de 200 mil réis. O montante garantiu a subsistência de Maria pelo período de um ano. Ao mesmo tempo, promoveram no Rio de Janeiro uma subscrição para o mesmo fim. Contudo, a ação não logrou êxito, tendo em vista que alguns cidadãos levantaram dúvidas se Gonçalves Dias teria, realmente, uma irmã.

No ano de 1886, diante das alegações de que Gonçalves Dias só tinha uma irmã, e esta se chamava Joana Gonçalves Dias, uma comissão (formada por: José do Rego Medeiros, Antônio de Sousa Coutinho e Francisco dos Reis Aguiar) soltou uma nota no jornal Pacotilha atestando que o poeta tinha mais irmãos pelo lado materno. Dizendo em certa altura da publicação: “Ora, se os filhos da madrasta do poeta são considerados irmãos, não vemos razão nenhuma para que o não sejam igualmente os filhos de sua própria mãe”.

Em 1886, conforme nota publicada no jornal Pacotilha (MA), dos quatro filhos de Vicência, só estava viva a filha mais velha, Maria Magdalena.

Em 1887, o jornal Gazeta noticiava que a irmã do poeta, impedida de trabalhar por conta da idade (já sexagenária), andava, de porta em porta, pedindo esmola nos lares de Caxias. A última notícia que se tem de Maria Magdalena data do ano de 1891, quando o Conselho da Intendência Municipal de Caxias mandou ser concedido mensalmente um auxílio de 10$ em seu favor. A casa da antiga Rua das Tabocas ainda ficou de pé por alguns anos; o IPHAN, por volta da década de 1940, chegou a fotografá-la. Tempos depois, o imóvel fora demolido. Atualmente, quem passa por aquele logradouro nem imagina que, um dia, ali habitou a mãe e irmãos do filho mais ilustre de Caxias. Dona Vicência, não fora homenageada nem como nome da via que, atualmente, leva o nome do sobrinho de Gonçalves Dias, o também poeta, Teófilo Dias.


Fontes de pesquisa: Jornal Pacotilha; Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto; Livro Efemérides Caxienses/Autor: Arthur Almada Lima Filho; Jornal O Paiz; Depoimento de Daniel Lemos; Jornal A Luta Democrática; Anais da Biblioteca Nacional (RJ); Correio IMS; Jornal do Comércio (RJ); Jornal Gazeta; Diário do Maranhão.

Imagens da publicação: Ac. do IPHAN; Internet; Ac. IMS; Jornal Diário do Maranhão

Restauração e Colorização: Brunno G. Couto