Show de Mágica no Teatro Fênix, no final do século XIX

Encantando, há séculos, as mais diversas audiências, o ilusionismo é uma arte antiquíssima; tendo os seus primeiros registros de existência remontando há pouco antes do nascimento de Cristo. Contudo, é no fim do século XIX que a mágica torna-se cada vez mais uma arte séria e respeitada, regulada por um código próprio – um acordo de sigilo sobre os truques. Nessa época, muitos mágicos brasileiros começam a fazer apresentações itinerantes pelo país. No Maranhão, um dos mais famosos chamava-se: Deocleciano Belfort.

Os registros da atuação profissional de Deocleciano começam a surgir nos periódicos maranhenses no ano de 1890, quando este realizava apresentações por São Luis (apesar de incerto, é muito provável que Deocleciano fosse ludovicense). Ostentando um exuberante bigode, o esbelto mágico possuía uma comitiva artística muito semelhante a um circo, onde, além do seu show de mágica, apresentavam-se ginastas e palhaços, compondo um grande espetáculo de seis partes. Através de reclames sensacionalistas nos jornais, Deocleciano divulgava seu show ao grande público.

E assim, depois de aclamadas apresentações por São Luis e Codó, em 1893 Deocleciano Belfort veio à Caxias. O local da primeira apresentação do mágico na cidade é desconhecido. Contudo, para o seu segundo show fora escolhido o ainda inconcluso Teatro Fênix, à Rua dos Quintais (Atual Aarão Reis). Necessitando de auxílio para a conclusão de suas obras – iniciadas por volta da década de 1880 -, o espetáculo fora realizado em benefício do teatro. Destarte, o show fora agendado para 14 de maio de 1893, um domingo.


Fachada do Teatro Fênix em fotografia recente. O teatro, atualmente, encontra-se abandonado.

Programa da apresentação de 14 de maio de 1893, no Teatro Fênix. Gazeta Caxiense.

Diferentemente do espetáculo realizado na capital, a apresentação de Caxias fora estruturada em três partes, englobando: hipnotismo, adivinhação, ilusão e magnetismo. A primeira parte era dedicada à Orquestra do teatro, que realizaria a abertura do espetáculo. A segunda parte era destinada à apresentação de Deocleciano. E na terceira parte aconteceria uma apresentação humorística, bem como mais números de ilusionismo. O grande e esperado truque era chamado “A sonâmbula vagando no ar”, possivelmente um número de levitação.

A apresentação foi um sucesso, tendo sido elogiada nas linhas dos jornais de Caxias, que também não deixaram de pontuar o comportamento do público pagante: “A plateia, que até então era de um comportamento reprovável, pois fazia um barulho infernal, felizmente neste último espetáculo esteve mais calma e educada possível, graças a energia da polícia”.

Depois das apresentações, Deocleciano partiu com a sua comitiva, não se tendo notícias de outras apresentações suas em Caxias. Posteriormente, no início do século XX, outros ilusionistas pisaram no palco do Fênix. Contudo, ao que se sabe, Deocleciano Belfort foi o primeiro deles.


Fontes de pesquisa: Revista Super Interessante; Jornal Gazeta Caxiense

Imagem da publicação: Hemeroteca Digital; Google Maps

Teatro Fênix

Fundado no século XIX, o prédio foi obra da Sociedade Dramática Caxiense (sociedade criada em 1880, da qual participavam o dr. Eduardo de Berredo, o prof. José do Rego Medeiros e o dr. José Firmino de Carvalho). Próximo a sua conclusão, em 1882, o teto do teatro desaba, sendo reconstruído sob supervisão do engenheiro inglês Hyran W. Mappes Jr. Com suas instalações à Rua dos Quintais (Atual, Aarão Reis), o teatro chegou a ser criticado por estar distante do centro da cidade (àquela época, a referida rua fazia parte dos chamados arrabaldes).

Fachada, em ruínas, do Teatro/Auditório Fênix, em 2012. Imagem: Google Maps.

Várias companhias europeias apresentaram-se nesse teatro, entre as quais a italiana Balsamani & Cia, em 1885; a Ficarra e Varella; e a Companhia Luso-Brasileira, que passou quase todo o mês de dezembro de 1901, em Caxias. O compositor caxiense, Elpídio de Brito Pereira, consagrado na Europa e no Brasil, realizou no Fênix dois concertos sinfônicos com composições de sua autoria. A orquestra do teatro era regida pelos maestros Coutinho e Carimã Junior.

Além das exibições teatrais, fora no Fênix que se realizaram as primeiras exibições cinematográficas de Caxias. O ano era 1902, o cinema já tinha quase 7 anos de idade; através do cinematógrafo do alemão Bernard Bluhm, que estava de passagem para Teresina, exibiu-se diversas películas na noite de 30 e 31 de agosto daquele ano. A relação do Fênix com a sétima arte não parou por aí. Na primeira metade do século XX, muitos cinemas funcionaram no prédio, tais como: Cine Odeon, Royal Cinema e Cine Guarany. Além disso, foi nas dependências do Teatro Fênix que, em 01/05/1915, fora criada a União Artística Operária Eleitoral Caxiense. 

Gravura de divulgação do show do ilusionista italiano, em 1905. Imagem: Jornal O Paiz.

Devido às suas acomodações, o teatro era palco de diferentes atrações. Em 1905, o Fênix recebeu o ilusionista italiano Salvatore Vigilante, que excursionava pelo Brasil. Por meio de uma propaganda sensacionalista, típica da época, o mágico, através dos periódicos locais, alertava o público sobre o impacto do truque de decapitação: “Para esta impressionante cena, previne-se ao respeitável público, ou para melhor dizer, aos senhores maridos para não conduzirem ao teatro senhoras com avançado estado de gravidez; isto é um aviso simplesmente, para que na ocasião de ‘decepar a cabeça do corpo’, o sangue que aparecer não possa causar qualquer emoção ou desmaios às senhoras”. 

Com o fim de sua sociedade fundadora, o presidente, José Castelo Branco da Cruz, doou o prédio à Intendência Municipal, em 1914. Em 1938, através de um decreto, o prefeito, Alcindo Guimarães, transfere a administração do teatro ao Ginásio Caxiense, que havia sido fundado três anos antes, e ladeava o teatro. Dentre as exigências estabelecidas estava a de que, caso o colégio encerrasse as suas atividades, o teatro voltaria à municipalidade. 

Alunos, mestres e populares, durante alguma solenidade nas dependências do Fênix (pós-reforma), na década de 1960. Imagem: Ac. de Aluízio Lobo.

Ao longo de sua existência, o Teatro Fênix recebeu diversos espetáculos, de peças infantis à apresentações musicais. Funcionava, também, como auditório do Colégio Caxiense, que, constantemente, promovia diferentes solenidades em suas dependências.  Durante o primeiro mandato do prefeito Aluízio Lobo (1966/1970), o teatro recebeu uma nova reforma em suas instalações. Através dessa completa remodelação, passou a contar com 600 poltronas confortáveis, e com um amplo palco com cenário e pano de boca (foto abaixo).

O então governador, José Sarney, discursa nas dependências do Teatro Fênix (pós-reforma), por volta de 1967. Imagem: Ac. de Aluízio Lobo.

Em 2000, na sede do teatro fora fundada a companhia teatral Eva Fênix, objetivando ajudar jovens com dificuldade de leitura e problemas de socialização. Sob a direção de Érica Almeida, o grupo ainda se encontra em plena atividade.

Imagem área do Teatro Fênix, em 2018, já sem o teto. Imagem: Claudinho Siqueira/YouTube.

O Teatro Fênix funcionou até início dos anos 2000. Contudo, já não apresentava mais a popularidade dos tempos áureos. Com o fim do Colégio Caxiense, na abertura do século XXI, o teatro, conforme preceituava o decreto de 1938, voltou a pertencer à prefeitura. Abandonado, em 2009, o seu teto desaba; preservando atualmente apenas a sua fachada. Tomado pelo mato e com eminente risco de desabamento, o imóvel, nem de longe, lembra aquilo que já foi um dia.

Imagens internas do teatro após o desabamento de seu teto. Imagem: Blog do Sabá.
Ruínas do antigo palco. Imagem: Blog do Sabá.

Assim como diversos outros imóveis de Caxias, o Fênix clama, há anos, por uma reforma.


Fontes de Pesquisa: Livro Por Ruas e Becos de Caxias/Autor: Eziquio Barros Neto; Livro Efemérides Caxienses/Autor: Arthur Almada Lima Filho; Site Eziquio Barros Neto; Livro Cartografias Invisíveis/Diversos Autores; Jornal O Paiz; Blog do Sabá.